Artigos / Relatos

Mosaico de Docência – Dr. Prof. Gilberto S. Alves

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AUTOR – Gilberto S. Alves, MD, PhD
Pós doutor em Psiquiatria – Goethe Universität
Professor Adjunto – Faculdade de Medicina – UFC

 

 

 

O que é a síndrome de BURNOUT?

 

O burnout é uma síndrome relacionada a exposição prolongada ao stress no ambiente profissional. O transtorno não é categorizado pelo Manual de transtornos mentais da Associação Americana de Psiquiatria(DSM-5), embora haja propostas para a elaboração de um diagnóstico específico. Já na Classificação Internacional das Doenças (CID-10), da Organização Mundial de Saúde (OMS), está listada entre as categorias ligadas no manejo da vida cotidiana (Z 73). Envolve sobretudo profissões de risco, como médicos, enfermeiros, aviadores, policiais, bombeiros, militares.

Dentre alguns fatores de risco conhecidos na literatura, estão as mudanças no ambiente de trabalho, principalmente a maior competitividade, mas algumas situações, como o assédio psicológico, podem ser desencadeantes. Como todo transtorno mental, a vulnerabilidade biológica, ou predisposição biológica ou genética, cumpre um papel importante. Além disso, fatores ligado ao temperamento e personalidade tem recebido atenção progressiva nas pesquisas mais recentes. Podemos conceituar de maneira mais simples o temperamento como um traço mais inato do comportamento humano. Por exemplo, quando observamos na maternidade o comportamento dos bebês, vemos que há aqueles que choram mais alto e os que dormem mais tempo. Ao longo dos meses, estas diferenças continuam a serem observadas;alguns bebês estranham com maior frequência pessoas estranhas, enquanto outros sorriem e parecem mais sociáveis ao contato. Por outro lado, a personalidade pode ser entendida como a soma das características do temperamento e a influência ambiental, como a educação, as experiências de vida, os estímulos da infância, etc. Um terceiro elemento importante para o desenvolvimento do burnout diz respeito aos chamados mecanismos de proteção ou resiliência, também conhecido como coping. Estes mecanismos funcionam como fatores protetivos e de enfrentamento à situação de stress e envolvem a mobilização de recursos psicológicos do próprio indivíduo.

As principais dimensões do burnoutsão a exaustão emocional, a despersonalização e a baixa realização profissional. A exaustão emocional, como sugere o próprio nome, é sensação de esgotamento psicológico, em geral acompanhada de intensa ansiedade, irritabilidade e angústia, por exemplo, quando o indivíduo no trabalho reage de maneira descontrolada e intensa a uma nova demanda de seu chefe ou ao excesso de pessoas a serem atendidas em uma repartição pública. A despersonalização, também conhecida como cynicism, pode ser compreendida como um sentimento de indiferença ou distanciamento afetivo frente aos elementos de stress do ambiente. Por exemplo, quando pessoas vítimas de assédio moral ou bullyingem uma reunião com seu chefe de trabalho deixam de manifestar, de exibir o intenso sofrimento psicológico como a angústia, choro, sensação de coração apertado, e passam a se comportar de forma mais fria ou indiferente. Longe de ser considerado um mecanismo saudável de enfrentamento psicológico, o cynicism pode esconder um intenso sofrimento psicológico reprimido pelo indivíduo. Por outro lado, a baixa realização profissional implica em um sentimento de baixa atração ou interesse pelo trabalho, como se esta atividade perdesse o sentido e importância na vida do indivíduo.

Como diferenciar o Burnout de outros problemas de saúde mental?

Para que o burnout possa ser identificado de forma mais confiável, dois fatores precisam ser levados em consideração. O primeiro deles é a elevada prevalência de transtornos mentais na comunidade, sobretudo o que se conhece na psiquiatria como transtornos do humor. Evidências de estudos populacionais estimam a prevalência dos sintomas depressivos em 15% e a presença de depressão maior em 1 a 3%. Aprevalência de transtornos de ansiedade ainda pode ser considerada mais comum e está em torno de 18 a 30%. É preciso lembrar que boa parte das pessoas portadoras destes transtornos ocupa posições ativas e não faz, nem nunca pensou em fazer algum tratamento em saúde mental.

Outro aspecto pertinente são os custos financeiros gerados pelos problemas psiquiátricos, entre eles o absenteísmo no trabalho, principalmente quando diagnosticados tardiamente. A psiquiatria responde sozinha por 10% dos encargos econômicos por saúde; a depressão, por 1,5% dos encargos, segundo dados da própria OMS, (Harvard University, Murray & Lopez, 1996). Daí a enorme importância de se buscar treinar os profissionais que integram equipes de saúde em empresas ou repartições públicas, sobretudo médicos, assistentes sociais, enfermeiros e psicólogos para o diagnóstico e acompanhamento destas condições clínicas, sobretudo nos grupos de risco, como é o caso de muitos funcionários com problemas na frequência e produtividade no trabalho.

 

Modalidades de tratamento na síndrome de Burnout

Uma vez que o diagnóstico é estabelecido, diversas modalidades de tratamento podem auxiliar o trabalhador que sofre com sintomas emocionais e comportamentais. Logicamente, é importante que o profissional esteja preparado para o adequado diagnóstico do burnout, já que esta síndrome pode ser confundida facilmente com quadro depressivos ou de ansiedade, ou em geral, os fatores estressores são menos determinantes para a persistência dos sintomas. De forma mais resumida e didática, podemos dividir o tratamento do burnout em estratégias farmacológicas e não farmacológicas. Antes de ir direto ao tema, é importante que o médico ou profissional responsável pelos atendimentos de funcionários desenvolva uma rede de encaminhamento efetiva. Ter contato com psiquiatras, psicólogos ou outros profissionais de saúde mental é importante para que o encaminhamento seja efetivo, direcionado e tenha mais chances de se transformar em um tratamento bem sucedido. Dito isso, as estratégias medicamentosas envolvem o uso de medicações antidepressivas e para a ansiedade, insônia ou qualquer outro sintoma correlato. No contexto do tratamento, é importante que o paciente receba a informação devida a respeito da indicação da medicação, potenciais efeitos colaterais e o resultado esperado, bem como dos riscos em relação ao não tratamento. Um dos muitos mitos que precisam ser desfeitos no inicio do tratamento é o de que o pacienteficará para sempre dependente da medicação. Prometo voltar a este tópico em publicações futuras neste blog, já que é necessário discorrer mais amiúde sobre o tema. Em resumo, é importante que se esclareça que ninguém fica pelo resto de sua existência dependente de qualquer medicação disponível comercialmente para uso como psicofármaco.

Em relação ao manejo não medicamentoso do burnout, diferentes abordagens estão disponíveis e a psicoterapia, ou acompanhamento psicológico, talvez seja a mais conhecida delas. Existem diferentes modalidades (ou escolas teóricas) de psicoterapia e é fundamental que o paciente receba orientações a respeito destas modalidades, para que possa com maior liberdade, escolher aquela com a qual se sinta mais identificado. Uma das abordagens psicológicas mais conhecidas é a teoria cognitiva comportamental. Nesta técnica, o paciente pode aprender a identificar pensamentos recorrentes (também conhecidos como distorções cognitivas) e que influenciam a ocorrência de sintomas, agravando a sua ansiedade. Um exemplo: ao sentir uma leve opressão no peito, o paciente pode desencadear uma série de pensamentos catastróficos, como será que estou enfartando?Tais pensamentos, por sua vez, podem acentuar o fluxo de pensamentos negativos, levando o paciente a desenvolver mais temores e preocupações ou a ter de vez a convicção de que está mesmo enfartando.

A maior difusão da informação nas mídias eletrônicas também tem permitido o uso em diversas empresas de escalas de avaliação do humor e comportamento, por exemplo, o inventário Maslach de Burnout, cuja versão em português pode ser acessada facilmente na web. As escalas tem entre outras vantagens, a facilidade no uso e interpretação, sendo um instrumento importante para o rastreio de pacientes e para decisões quanto ao diagnóstico e tratamento, embora evidentemente, não substituam à altura uma boa avaliação clínica.

Mais recentemente, algumas empresas brasileiras tem investido na formação de grupos de discussão e manejo de situações de trabalho difíceis. Nestes grupos, os profissionais são encorajados a expor suas dificuldades emocionais, frustrações e temores relacionados ao ambiente de trabalho. Uma das grandes vantagens dessa técnica é a oportunidade de compartilhar experiências e dificuldades, trabalhando o sentimento de empatia (isto é, de se sentir ouvido e levado em consideração sobre suas queixas), cooperação e motivação (é possível transpor barreiras até então inimagináveis no enfrentamento de situações estressoras). Mais recentemente, uma técnica que mistura elementos do budismo, transcendentalismo e psicologia – o mindfulness– ou atenção plena, tem sido difundida como uma estratégia eficiente para o controle dos sintomas físicos e psicológicos de ansiedade.

Em resumo, o burnout é uma síndrome clínica caracterizada por sintomas do humor importantes e três dimensões principais – a exaustão emocional, a despersonalização e a baixa realização emocional. Hoje o burnout é um importante problema de saúde, relacionado à piora da qualidade e vida do trabalhador, menor produtividade no ambiente laboral e elevados custos sociais e econômicos, os quais demandam uma revisão profunda das políticas públicas direcionadas ao seu enfrentamento.

 

 

 

Sugestão de leitura

 

  1. Associação Brasileira de Psiquiatria – ABP comunidade – http://www.abpcomunidade.org.br/site/?page_id=70
  2. CARVALHO, J. A.; Nascimento AL et al. Entendendoostranstornosmentais. Rio de Janeiro : ABP editora, 2010, v.1. p.140.

Mosaico Docente – Prof. Rui Rodrigues Aguiar

MEU EU INTERIOR

(publicado originalmente em “O POVO”, Fortaleza, 18 de abril de 2016)

Quem como eu chegava em Fortaleza nos anos 1980, era recebido na Cidade com a mais filosófica das perguntas: “Qual é o seu interior?”. Aos poucos fui encontrando outras pessoas que haviam ou continuavam a responder diariamente à mesma pergunta, entendendo com elas que esta cidade é uma federação de municípios. Em vários de seus bairros ainda encontramos o ar e os personagens das cidades do interior do Ceará. Embora mais raras hoje, cadeiras nas calçadas e alguns costumes sertanejos denunciam algo que trouxemos na bagagem quando chegamos aqui.

Mosaico Docente – Prof. Rui Rodrigues Aguiar

VIDAS POR TRÁS DAS ESTATÍSTICAS

(publicado originalmente em “O POVO”, Fortaleza, 20 de fevereiro de 2015)

Na década de 1980, o Ceará ocupava a terceira posição em um ranking de Estados que chocava a opinião pública: o da mortalidade infantil. Para cada mil crianças que nasciam vivas, 111 morriam antes de comemorar o primeiro aniversário. A pauta da infância e da adolescência surgia forte no Brasil em meio à redemocratização. Muito mais do que uma mudança de nomenclatura, o conceito de sujeitos de direitos exigia de todos atenção prioritária para as demandas de crianças e adolescentes.

Mosaico Docente – Prof. Rui Rodrigues Aguiar

PRECISAMOS DE TODOS OS ADOLESCENTES

(publicado originalmente em “O POVO”, Fortaleza, 19 de fevereiro de 2015)

Um dos grandes problemas da urbanização brasileira é o aumento das desigualdades sociais que trouxe consigo fenômenos únicos, como o homicídio de adolescentes. Alguns desses fenômenos se tornaram tão graves que exigiram a criação de índices capazes de medi-los e monitorá-los. Índices sinalizam trechos específicos da nossa história e apontam para onde vamos como sociedade. O Índice de Homicídio de Adolescentes revelou que Fortaleza não contou ao final de 2012 com 9,9 adolescentes de cada grupo de mil jovens entre 12 e 18 anos, mortos naquele ano. Projeções indicam que outros 2.988 morrerão até 2019 se nada for feito hoje.

Mosaico Docente – Prof. Marco Túlio Aguiar Mourão Ribeiro

FORMAÇÃO MÉDICA: READEQUAÇÃO DO CURSO DE MEDICINA PELAS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES

A formação de recursos humanos para saúde está prevista pela Constituição federal, pela LEI 8.080- Lei orgânica de saúde- que traz como premissa o estímulo e ordenação do processo de formação dos profissionais de saúde, aptos a atender às necessidades do SUS. Nos últimos anos, a formação médica tem sido amplamente discutida. No Brasil e no estado do Ceará várias políticas e medidas interinstitucionais foram instituídas e podem ter influenciado a formação dos médicos neste estado.

Mosaico Docente – Profa. Dra. Maria Isis Freire de Aguiar

CURSO DE FORMAÇÃO EM TRANSPLANTES

A Liga Acadêmica de Enfermagem no Transplante (LAET) promoveu no primeiro semestre de 2016 um “Curso de Formação em Transplantes”, direcionado para os alunos que atuam na Liga e demais interessados na área.

O transplante de órgãos e tecidos é uma modalidade terapêutica que viabiliza o tratamento de inúmeras enfermidades, proporcionando ao paciente sobrevida nas doenças em estágio terminal, além de melhorar a qualidade de vida dos indivíduos.

Mosaico Docente – Profa. Vanessa Louise Batista

A VIDA E A ARTE CAMINHAM JUNTAS ENTRE LEITURAS DE MUNDO, CENAS E CENÁRIOS; ENTRE ÉTICA, E ESTÉTICA DA INTERAÇÃO SOCIAL.

Ler o mundo é condição humana de viver em sociedade. Construir o mundo é condição de ser social e político. Transformar o mundo é condição de construí-lo com liberdade, é viver a potência da vida pública rumo à democracia. As cenas cotidianas em situação de interação social podem ser concebidas como dramáticas e lidas a partir de uma dramaturgia do social e da psique. Assim a vida se interpreta com teorias estéticas e a arte de viver torna-se um caminho criativo do andante. A vida é, também, poesia e lírica… É arte e utopia que se faz no palco da interação.

Mosaico Docente – Profa. Vanessa Louise Batista

A DRAMATURGIA SOCIOLÓGICA DE ERVING GOFFMAN

Este texto visa refletir a respeito da teoria de papéis de Erving Goffman, priorizando as relações regionais – o palco, a plateia e os bastidores. A partir deste recorte, objetiva-se discutir os conceitos utilizados pelo autor, a fim de buscar em sua compreensão dramatúrgica as dimensões éticas e estruturais do sistema social postas nas definições e conceitos de sua teoria. Para tanto é preciso ler na linguagem dramatúrgica e Goffman  o teatro enquanto movimento social, a partir de sua história a importância na sociedade desde a Grécia Antiga, onde nasceu como expressão popular se expandindo aos castelos medievais.

Mosaico Docente – Profa. Vanessa Louise Batista

ENSAIO SOBRE INFÂNCIA E FORMAÇÃO DOCENTE: DESAFIOS QUE EDUCAM PARA A VIDA EM SUA POTENCIALIDADE.

Historicamente no ocidente, as realidades das crianças e instituições socializadoras como a família e a escola vêm sofrendo inúmeras transformações que deflagram novas demandas socioculturais em tempo de mundialização. A contextualização das condições políticas nacionais em relação à genealogia simbólica e a efetiva produção da cultura brasileira é uma metodologia necessária para o conhecimento e ampliação da concepção de novos caminhos para a sustentabilidade.