Mestre Machado

Coluna semanal com textos sobre docência escritos pelo professor Raul Nepomuceno da Faculdade de Direito.

Mestre Machado 07 – Coisas que não se ensina

mestremachado-01Machado tem um conto intitulado “Ex cathedra”, que conta a história de certo senhor idoso chamado Fulgêncio, que amava os livros e as ciências, passava o dia inteiro lendo, de manhã, de tarde, de noite, sob os cuidados de uma mocinha, sua afilhada, adolescente de catorze anos de idade, de nome Caetaninha. Fulgêncio lia sobre tudo: filosofia, geografia, história, direito, biologia, matemáticas… Aliás, foi ele quem cuidou, pessoalmente, da educação da afilhada.

Mestre Machado 06 – Há sempre uma desculpa

mestremachado-01Uma das marcas registradas de Machado de Assis é a luta interior de seus personagens diante de dilemas, muitas vezes personagens ambíguos, demasiadamente humanos.

Frequentemente, um personagem pensa em fazer algo que ele mesmo julga errado, moralmente reprovável, mas, em seguida, passa a buscar, internamente, justificativas para o seu erro. E sempre encontra.

Logo no começo de “Esaú e Jacó”, duas distintas senhoras da elite carioca vão caminhando pela rua – uma delas vai feliz da vida, por razão que o livro explica no começo – quando passam por um sujeito pedindo dinheiro para a “missa das almas”. Não era um mendigo, apenas um pobre coitado que ajudava nos trabalhos da Igreja, e ficava ali pedindo dinheiro para a realização de missas pelas almas que estavam no purgatório. Aquela senhora que vinha exultante tirou da bolsa uma nota de 2 mil réis novinha e colocou na bacia ao chão – bacia que até então cotinha apenas algumas moedas de pequeno valor. E foi embora. Hoje, seria mais ou menos como dar uma nota novinha de 100 reais.

Mestre Machado 04 – A abolição do tempo

mestremachado-01Prisioneiros do tempo, é isto que somos. Desde o despertador que interrompe o sono profundo às 6h da manhã, passando pelas inúmeras conferidas no relógio no decorrer do dia, hora disso, hora daquilo, até olhar pela última vez pouco antes de dormir.

Quando Brás Cubas tinha insônia, normalmente a madrugada era repleta de melancolia e enfado. Deitado, ficava ouvindo o barulho do relógio pendurado na parede anunciar a cada segundo, que um segundo a mais lhe era subtraído.

Mestre Machado 03

mestremachado-01Machado de Assis era um exímio observador. Enxergava o que poucos são capazes de enxergar e, o que é mais impressionante, expressava isso com habilidade e clareza insuperáveis – e quase sempre cruéis.

Um dos meus contos favoritos de Machado se chama “Teoria do Medalhão”. Trata-se de obra magna da mais pura e fina ironia. É um diálogo entre um pai e seu filho recém-chegado à maioridade (na época, 21 anos). A história começa exatamente quando se encerra a festa de aniversário de 21 anos do rapaz, momento em que seu pai o chama para uma conversa muito séria.

Mestre Machado 02

mestremachado-01Hoje tenho o grande privilégio de lecionar na mesma Faculdade em que estudei quinze anos atrás. Ministro aulas nas mesmas salas em que estudei, e ali ainda estão as mesmas cadeiras, as mesmas paredes, o mesmo quadro.

Às vezes, quando a aula termina, fico olhando para a sala vazia, para os bancos nos corredores, e, mergulhado em nostalgia, volto no tempo para ver um grupo de jovens conversando, eu e meus colegas, com 18 ou 19 anos, cheios de certezas – dentre as quais as mais firmes eram a de que nossa vida era infinita e a de que ela era prenhe de realizações grandiosas – e penso no que mudou de lá para cá.

Mestre Machado 01

mestremachado-01Bem, pessoal, aqui começa minha pequena contribuição para esse projeto tão legal que é o blog da CASa/UFC.

Meu nome é Raul Nepomuceno, sou professor da Faculdade de Direito, lotado no Departamento de Direito Público, mas não é exatamente sobre Direito que venho tratar. Pretendo compartilhar aqui algumas reflexões, até agora solitárias, sobre a minha maior fonte de prazer nas letras: a obra de Machado de Assis.

Mestre Machado – Apresentação

mestremachado-01SOBRE A COLUNA

Mestre Machado:

Machado de Assis foi um mestre das letras e também dos temas relativos à alma humana. A experiência de ler seus textos é reveladora de nossa própria condição, e quem lê acaba se sentindo lido por ele. Está tudo lá: nossas fraquezas, nossas ambiguidades, nossos sonhos, nossas frustrações, nossos medos.

“Mestre Machado” é sobre as reflexões que Machado de Assis nos deixou e que são aplicáveis na vida de qualquer um, em especial na vida de um professor. Engana-se quem acha que em sua obra há apenas historinhas sobre triângulos amorosos e ganância. Esse é apenas o mote. Entre uma cena e outra, entre um beijo furtivo e uma morte triste, há os comentários, a glosa, a revelação, e essa digressão é tudo. Como disse Drummond, falando dele: “Outros leram da vida apenas um capítulo, tu leste o livro inteiro.”

Sobre o autor:

Meu nome é Raul Nepomuceno, sou professor do Departamento de Direito Público da UFC, leciono Direito Penal e Criminologia. Sou casado com Aline e pai de Ana e de Bruna. Nas horas vagas, que são poucas, encontro nos textos Machado de Assis fonte de riso e de melancolia, tudo junto e misturado, como uma coisa apenas, diante dos enigmas da vida.​