Daniel Maia 2

Daniel Maia
Professor Doutor de Direito Penal da Universidade Federal do Ceará – UFC.
profdanielmaiaufc@gmail.com

 

 

 

PCC, CV e agora GDE, o que falta surgir para o Estado reagir?

Já não é mais novidade que as facções como o Primeiro Comando da Capital – PCC, Comando Vermelho – CV e a mais nova Guardiões do Estado – GDE tomaram conta não somente da periferia de Fortaleza, mas de todo o Estado, estabelecendo em vários bairros de diversas cidades normas de convivência, tribunais de exceção para o julgamento daqueles que infringem as regras impostas pelo crime organizado, toque de recolher para os moradores e até restrições de entrada no bairro para quem estiver de capacetes ou com os vidros dos carros fechados, sendo a polícia desafiada diariamente com pichações nas quais se lêem frases como “Aqui a polícia não entra!”, divulgadas frequentemente em redes sociais e em diversas matérias jornalísticas.

Essa realidade tem se tornado comum e parece estar tomando ares de normalidade, quando, na verdade, não é. Entretanto, o que me assusta e indigna é a absoluta falta de interesse estatal em enfrentar, de maneira eficiente, essas facções. Não é possível que percamos a capacidade de nos indignar com a inércia do Estado em combater essa criminalidade baseada no trafico de drogas, o qual corrói os jovens de famílias de todas as classes sociais.

Chega a ser emblemático e triste o domínio dessas facções nos presídios cearenses, os quais, mais que escritórios do crime, estão a cada dia se tornando condomínios das organizações criminosas, as quais gravam vídeos que são postados na internet fazendo todo tipo de transgressão disciplinar que um detento possa imaginar. Desde festas regadas a bebidas alcoólicas e forró, as quais são decoradas com cartazes e faixas que orgulhosamente ostentam as siglas de suas facções, até o uso generalizado de celulares e computadores, os quais além de servirem para postar as fotos dessas verdadeiras farras, são a principal ferramenta para o funcionamento do crime organizado, o qual de dentro dos presídios ordena crimes e coordena seus marginais do lado de fora. E o Estado faz vista grossa, não tomando absolutamente nenhuma providência eficaz contra isso. Por quê? Tecnologia a um baixo custo já existe faz tempo para possibilitar esse bloqueio. Aliás, não vejo nenhuma autoridade explicando por qual motivo não se bloqueiam os celulares dos presos no Ceará. Impedir a comunicação dos presos com os criminosos que estão soltos é o mínimo que deveria ser feito, mas infelizmente nem isso acontece.

É preciso que se diga que o Estado pode continuar contratando milhares e milhares de Policiais Militares, que a violência não diminuirá, pois esta arraigada dentro do próprio sistema prisional. O irônico disso tudo é que era para ser mais fácil controlar o crime dentro das instalações do Estado do que nas ruas, mas isso não ocorre simplesmente por falta de vontade ou coragem política para desarticular tais facções. E aqui é bom registrar que a culpa por esse quadro está longe de ser do Direito Penal ou mesmo do Poder Judiciário, mas é sim do Estado-Administração, o qual é quem tem o poder e o dever para tomar medidas administrativas para coibir esse escárnio nos presídios.

Aprendi que o Estado é o ente mais poderoso da sociedade, devendo todos que o compõem seguir suas regras, mantendo-se, assim, um pacto que permite o convívio em sociedade. Dessa forma, é obvio que nenhuma facção criminosa se manteria de pé – pelo menos não com tanto deboche pelo poder público como fazem atualmente – se houvesse vontade de usar a força estatal para combatê-las.

O fato é que temos uma política criminal de combate ao crime organizado no Ceará de “faz de contas”, e temos que ter coragem para indagar: depois de PCC, CV e GDE qual sigla falta surgir para que o Estado acorde, retome o controle dos presídios, bloqueie a comunicação dos presos com criminosos e sufoque o tráfico de drogas que assola todo o nosso lindo Estado?