A Greve que parou o Brasil

 

Daniel Maia 2

Daniel Maia
Professor Doutor de Direito Penal da UFC
profdanielmaiaufc@gmail.com

Quando essa coluna foi escrita, ontem, 29 de maio de 2018, os caminhoneiros estavam há nove dias em greve. Hoje, caro leitor, a greve já pode ter acabado – o que eu não acredito que tenha ocorrido! -, mas, independentemente de quanto tempo ela dure, esse movimento paredista já causou resultados dantescos, seja na economia, que já contabiliza prejuízos na casa dos bilhões de Reais, se somados os danos públicos e privados; na agricultura e no agronegócio de modo geral, o qual registra perdas recordes, seja na distribuição dos produtos, seja na manutenção até da própria vida dos animais, os quais, sem alimentos, morrem à míngua em diversas fazendas do país; seja ainda na própria saúde, a qual, mesmo sendo um serviço de natureza essencial, tem sido prejudicada com a falta de entrega de medicamentos e materiais nos hospitais públicos. Tem-se notícias até de falta de combustível em ambulâncias! Isso tudo sem contar com o próprio cotidiano do brasileiro que se alterou nessa semana, pois muitos de nós sofremos com estradas interditadas e com filas enormes para abastecer, mesmo com preços exorbitantes. E quem paga essa conta de todo o prejuízo causado pela greve? Claro que todos nós, o povo brasileiro, que vê os preços dos produtos que ainda existem no mercado dispararem e se enxerga inundado de um sentimento de revolta diante de tamanha ineficiência e insensibilidade do Governo Federal, o qual, além de não ter tido êxito nas negociações, ainda foi insensível ao cogitar o uso das Forças Armadas para liberar as estradas.

Nesse ponto é salutar que se registre que o Governo Federal não se atentou que a greve não tem mais um líder único representando a categoria. Com as redes sociais da internet, a capacidade de comunicação e auto-organização do movimento seguiu o exemplo da Primavera Árabe e não necessitou de um sindicato ou um líder personificado que negocie diretamente com o Governo. Assim, enquanto as reivindicações não forem realmente atendidas e o sentimento geral dos grevistas mude, não adianta um sindicato dizer que a greve irá acabar, pois não irá.

Com tudo isso, poderíamos pensar que a greve, um direito previsto na Constituição Federal, não contaria com o apoio popular, afinal de contas somos nós, o povo, quem se prejudica diretamente com as consequências acima apontadas. Mas, não! O povo, de um modo geral, tem apoiado o movimento grevista. E por qual razão isso acontece? Simples! É pela a ocorrência do que o escritor alemão Ferdinand Lassalle dizia: “o que valida uma constituição é o sentimento geral do seu povo”. Assim, o direito à greve, previsto na nossa constituição, tem sido, neste episódio dos caminhoneiros, validado pelo sentimento geral de um povo que se vê muito mais representado pela revolta dos caminhoneiros do que pelo Governo formal que está no poder. Tem-se que os caminhoneiros, exemplarmente, estão fazendo o que todos que estão insatisfeitos com a atual política, absolutamente inexplicável, de preços dos combustíveis no Brasil deveriam fazer, ou seja, se mobilizar e fazer os governantes ouvirem o seu clamor.

Dessa forma, além da greve ser um direito formalmente concebido pela nossa Constituição, o movimento está moralmente validado pelo sentimento geral de revolta, que – repita-se: não parece ser contra os grevistas, mas, sim, contra o Governo. Assim, a greve dos caminhoneiros é juridicamente legal e moralmente justa.

Que essa greve, a qual parou o Brasil, sirva também para nos fazer parar e pensar sobre os próximos representantes que iremos eleger ainda este ano.