Doença de Alzheimer – também é preciso cuidar de quem cuida!

 1. Gilberto Sousa Alves;
2. Caio Jucá Lucena.

  1. Professor Adjunto de Psiquiatria; Departamento de Medicina Clínica, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará .
  2. Aluno de graduação do curso de Medicina, Universidade Federal do Ceará .

  1. Mas o que é demência e doença de Alzheimer?

O aumento nos últimos 100 anos da expectativa de vida, promovido principalmente pela redução das taxas de mortalidade e das melhorias de condições de vida, além de um maior acesso aos serviços de saúde, vem elevando em todo o mundo o número de indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos.  Acompanhando a mudança no perfil etário da população, houve o crescimento do número de doenças associadas ao envelhecimento humano e entre elas, a demência. O termo demência se origina do latim de (ausente) e mens mentis (mente), que indica sem mente ou fora da própria mente. No vocabulário médico, pode ser conceituado como perda progressiva, em grande parte das vezes irreversível, das habilidades intelectuais, como a atenção, linguagem, planejamento e memória. Estima-se que entre 2 e 8% da população com 60 anos ou mais sofrem de demência em um determinado momento. Mundialmente, a cada ano 7,7 milhões de novos casos são registrados. Em geral, há o crescimento do número de casos com a progressão da idade. Espera-se, desse modo, que o número de pessoas com demência duplique a cada 20 anos, atingindo cerca de 115,4 milhões de indivíduos em 2050, principalmente por causa do aumento rápido da expectativa de vida nos países subdesenvolvidos. No Brasil, espera-se para 2020 um contingente de 29,8 milhões de pessoas idosas (acima de 60 anos) e de 4,7 milhões acima de 80 anos, representando, respectivamente,um acréscimo de 9,2 milhões e 1,7 milhão de indivíduos na faixa etária de 80 anos ou mais, comparado aos números de 2010.

A demência é a principal causa de dependência e necessidade de cuidados em idosos. Em 2010, o custo global com a demência foi de 604 bilhões de dólares, entre custos com profissionais cuidadores, internações e medicamentos. Define-se como cuidador o prestador de serviços, com ou sem vínculo afetivo com a família, que assiste os pacientes com demência.  A formação de um cuidador com treinamento adequado, na realidade brasileira, ainda é precária. Levando em consideração que, atualmente, em muitos países os familiares moram em regiões diferentes por diversos motivos, ou não tem disponibilidade para deixar de trabalhar e se dedicar com exclusividade ao enfermo, o cuidador profissional surge como uma importante alternativa para garantir os cuidados primários necessários e especiais do idoso. Uma vez que o número de idosos tende a aumentar, supõe-se que esse profissional seja cada vez mais necessário e valorizado no mercado de trabalho. É importante salientar, contudo, que assim como os cuidadores familiares, os cuidadores profissionais (e os profissionais de saúde como um todo) também são submetidos a diversos estressores, principalmente com a piora dos sintomas do paciente com demência, e podem ter sua qualidade de vida consideravelmente prejudicada por causa dessa sobrecarga.

De acordo com o relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2012 intitulado “Demência: Uma Prioridade de Saúde Pública”, a demência é uma síndrome, normalmente crônica ou progressiva, cuja principal característica é a deterioração das funções cognitivas, além do que poderia ser considerado “normal” ao processo de envelhecimento. Ela não afeta a consciência do enfermo, mas atinge o pensamento, a orientação, o cálculo, a capacidade de aprendizagem, linguagem e o julgamento. Além da diminuição cognitiva, muitas vezes ocorrem também alterações do controle emocional e do comportamento social, o que dificulta a realização de atividades cotidianas, dessa forma comprometendo a autonomia do paciente. Essa condição afeta  principalmente  idosos acima dos 65 anos, apesar de não ser uma consequência natural do envelhecimento, ao contrário do que muitos acreditam, estando relacionada com doenças que afetam o cérebro direta ou indiretamente, tais como o Mal de Alzheimer (entre 60% e 70% dos casos), sendo a das principais causas de dependência e necessidade de cuidados especiais desse grupo populacional ,afetando drasticamente a sua qualidade de vida, assim como a de seus familiares e cuidadores.  Na maioria dos países, o processo de demência é considerado “normal” por uma porção significativa da população, dado o pouco conhecimento dessa condição, o que leva a estigmatização e isolamento, além da demora do diagnóstico.  Sendo assim, é importante salientar que a demência não faz parte do processo natural de envelhecimento

  1. Como se classificam as demências

A última edição do Manual Diagnóstico e estatístico dos transtornos Mentais DSM-5, editada pela Associação Americana de Psiquiatria, preconiza como critérios para o diagnóstico de demência a existência de um prejuízo cognitivo em um ou mais domínios intelectivos – por exemplo, no aprendizado, linguagem, atenção, entre outros – acompanhado da perda substancial na independência para atividades cotidianas, como por exemplo o pagamento de contas bancárias, o gerenciamento de despesas da casa,  o autocuidado com a saúde, entre outras.

As causas mais comuns de demência podem ser detalhadas abaixo:

  • Doença de Alzheimer (DA) – Corresponde a 60-70% dos casos em idosos e se se caracteriza pelo processo degenerativo que acomete inicialmente a formação do hipocampo, uma região relacionada aos processos de seleção e armazenamento de novas memórias. Esse quadro clínico é caracterizado por alterações cognitivas e comportamentais, com preservação do funcionamento motor e sensorial até fases mais avançadas da doença;

  • Demência Vascular (DV) – É a segunda causa mais comum de demência nos idosos com mais de 65 anos, com prevalência global de 15-20%; pode ser causada por uma série de microinfartos no tecido encefálico, comprometendo diversas áreas cognitivas.Muitos infartos podem ser “silenciosos”, não causando alterações. Contudo, com o passar do tempo,mais deles podem ocorrer, progredindo juntamente com os sintomas.Autópsias revelam que a maior parte dos casos de demências envolvem lesões cerebrais e vasculares (micro sangramentos cerebrais, por exemplo).Frequentemente, a demência e as doenças cardiovasculares apresentam fatores de risco em comum, tais como tabagismo, hipertensão, colesterol elevado e diabetes mellitus.

  • Demência com corpos de Lewy(DCL) - Incorpora tanto os casos de demência em pacientes com doença de Parkinson  quanto como os Corpos de Lewy (agregados anormais de proteínas que se desenvolvem no interior das células nervosas) e corresponde a 4-30% dos casos de demência. Apesar de avanços em testes e exames laboratoriais, o diagnóstico é principalmente clínico e exige habilidade do médico.As alucinações visuais são alterações muito frequentes neste tipo de demência, assim como sintomas relacionados ao parkinsonismo, como tremores e alteração na marcha. O estresse dos cuidadores costuma ser mais elevado nos pacientes com demência de Lewy e alguns estudos apontam uma menor expectativa de vida neste grupo de pacientes.

  1. Características epidemiológicas e clínicas das demências

Em virtude do curso quase sempre progressivo, a progressão da demência passa a incapacitar cada vez mais o enfermo. O aparecimento, dos sintomas psicológicos e comportamentais da doença, conhecido internacionalmente pela abreviação SPCD – sintomas psicológicos e comportamentais da demência, é bastante frequente no curso de demência, podendo inclusive anteceder as manifestações cognitivas, como a perda da memória. Historicamente, sabia-se de comportamentos associados à demência desde a descrição da doença de Alzheimer, em 1907. Contudo, apenas a partir de 1986 esses sintomas começaram a ser propriamente definidos. Inicialmente denominado de “agitação”, por causa dos comportamentos fora do padrão,logo médicos e pesquisadores perceberam que não apenas agitação, como outros sintomas ( depressão, distúrbios do sono) estavam relacionados e, em 1996, estabeleceu-se o termo SPCD. Tais alterações causam notável sofrimento tanto ao paciente quanto ao seu cuidador, sendo muitas vezes o principal motivo para a institucionalização do enfermo e estão associadas a uma taxa mais rápida de declínio cognitivo e maior comprometimento nas atividades da vida diária.

Alguns dos comportamentos frequentemente presentes nos SPCD são, por exemplo, gritar, resistir cuidados,distúrbios do sono, depressão, psicose e desinibição sexual. Importante lembrar que, antes de fechar o diagnóstico de SPCD, deve-se fazer uma cuidadosa investigação, avaliando história clínica e a saúde atual do doente, uma vez que várias condições (retenção/infecção urinária, constipação e dor, ou até mesmo iatrogenia medicamentosa) podem estar envolvidas na manifestação dos sintomas comportamentais. O SPCD e o desgaste do cuidador podem ser avaliados utilizando-se o Inventário Neuropsiquiátrico (INP), instrumento validado que compreende 10 sintomas (delírios, alucinações, irritabilidade,  desinibição, agitação, ansiedade, depressão, euforia e alterações psicomotoras),cuja pontuação se baseia na frequência e gravidade dos sintomas. A avaliação do estado cognitivo (memória , atenção, orientação, linguagens e habilidades viso espaciais), por sua vez, é realizada pelo Mini Exame do Estado Mental (MEEM). A tabela abaixo resume algumas das principais características das alterações comportamentais na demência.

Principais tipos de alterações comportamentais

Características

Comportamento Motor

Agitação manifesta com inquietação, andando, reclamando, frases repetitivas, agressão verbal etc  Ocorrem com frequências entre 24% e 48% dos casos. Em quase um quarto dos casos, os pacientes “vagam” sem propósito pela casa (wandering).

Distúrbios do Humor

A depressão é comum, apesar de normalmente não em sua apresentação típica. Outros distúrbios do humor predominantes são ansiedade, medo, irritabilidade, raiva, etc. Apatia, uma síndrome de diminuição da iniciação e motivação,  afeta mais de 70% dos indivíduos com AD nas etapas inicias e mais de 90% dos pacientes nos estágios posteriores; sendo um dos sintomas mais relatados.

Mudança de Personalidade

Aumento da passividade, diminuição da espontaneidade,  aumento da inatividade, sensação de insegurança e uma menor capacidade de resposta. Redução da socialização e do companheirismo e casos de irritabilidade também são vistos. O comportamento social é marcado por iniciativa reduzida, comportamento insensível e  falta de moderação.

Características Psicóticas

Geralmente de natureza paranóica, um exemplos seria a ideia de que alguém está ativamente planejando uma ação ( um roubo, perseguição) para prejudicar o paciente.Outras características psicóticas são delírios de infidelidade e de hipocondria.

Outros Sintomas

Quase 25% dos pacientes com demência nas enfermarias gritam excessivamente. Esse tipo de comportamento está frequentemente associado a higiene e ao banho, além de alto grau de comprometimento cognitivo. Também é importante destacar a presença de problemas do sono.

Os sintomas de SPCD normalmente são registrados e acompanhados pelo cuidadores do paciente. Acredita-se que o processo de demência resulta em uma maior sensibilidade aos estímulos do ambiente e também na perda progressiva dos mecanismos de enfrentamento (coping), sendo assim o ambiente torna-se cada vez mais estressante, resultando em ansiedade e comportamento inadequado. As bases neurobiológicas do SPCD ainda não foram bem definidas. Acredita-se que haja o envolvimento e perda funcional de regiões específicas do cérebro (os circuitos responsáveis por atividades emocionais, giro para-hipocampal, núcleo dorsal da rafe do locuscoeruleus e hipometabolismo cortical, por exemplo), culminando na piora dos sintomas. Outra proposta é a de que o desequilíbrio de diversos neurotransmissores (acetilcolina, serotonina, GABA.) também está envolvido nesse processo.

  1. Estresse do cuidador – Definição e aspectos clínicos

De acordo com a Portaria nº 2.528 de 2006, que aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI – Ministério da Saúde) e revoga a Portaria nº 1.395 de 1999, o termo cuidador define toda pessoa, membro ou não da família, que, com ou sem remuneração, formal ou informal, presta cuidados ao idoso que depende de auxílio em suas atividades diárias, como: alimentação, higiene pessoal, medicação, companhia aos serviços de saúde, serviços de banco ou farmácias, entre outros” (citação direta de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672013000400025)

A presença de SPCD é um dos principais responsáveis pelo estresse e sobrecarga dos cuidadores de pacientes com demência. Historicamente, o endocrinologista canadense Hans Sele foi o primeiro a pesquisar seriamente sobre o estresse, na década de 1930. Hans percebeu que diversos organismos respondiam apresentavam padrões de respostas fisiológicas semelhantes em seus tecidos quando submetidos a estímulos físicos ou psicológicas, as quais eram danosas ao organismo quando este estava sob condições estressantes. Identificou três fases do processo: alarme, resistência e exaustão. Ao analisarmos o contexto do profissional da saúde, com enfoque no cuidador do paciente com demência, percebemos que ele está inserido em um ambiente em que há uma elevada cobrança de excelência, assim como uma carga de trabalho muitas vezes extenuante. Sendo assim, podemos dizer que níveis moderados de ansiedade estimula o profissional a tomar medidas que auxiliem a resolver situações estressantes. Contudo, com o prolongamento dessa sensação o indivíduo pode apresentar sobrecarga e exaustão, o que pode resultar em uma menor produtividade no trabalho, além de consequências orgânicas e psicológicas. Outro termo bastante utilizado atualmente é o burnout, incorporado ao vocabulário da saúde mental na década de 1970.  Malac. e Jackson definiram, posteriormente, três dimensões pelas quais o burnout  é caracterizado , as quais são exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal no trabalho .Sendo relatado em muitos profissionais de saúde, levando a piora do humor, cansaço, abuso de substâncias e perda da motivação, o que também repercute nos pacientes, pois os profissionais tendem a interagir de maneira mais impessoal e com menos atenção; por fim, a organização na qual o profissional trabalha é afetada como um todo, podendo haver uma maior quantidade de absentismos e menor produtividade. Com relação aos cuidadores de pacientes com demência, diversos estudos com cuidadores familiares (que acompanham o enfermo antes de sua institucionalização), o que contrasta com a escassez de trabalhos com cuidadores profissionais, mostram semelhante nível de estresse em ambos os grupos.

Estresse do cuidador profissional:  Estudos realizados com cuidadores profissionais de pacientes com demência e SPCD demonstraram que altos níveis de burnout estavam  relacionados a uma menor vontade de prestar cuidados, menor otimismo e respostas emocionais negativas aos comportamentos do paciente, sendo que essa impessoalidade pode acabar por aumentar os índices de morbimortalidade. Por volta de um quarto dos cuidadores profissionais apresentam burnout em pelo menos uma das dimensões, além disso,  idade e os anos de serviço prestados aparentam serem  fatores importantes, porque cuidadores mais experientes tendem a ter menor exaustão emocional que aqueles mais jovens, provavelmente por já estarem habituados à demanda do trabalho. A exaustão emocional do profissional vem principalmente do intenso e constante contato com outros indivíduos ( incluindo, portanto, colegas de trabalho e pacientes que necessitam de cuidados), além da imprevisibilidade de sua rotina. Ao contrário do cuidador familiar, o profissional muitas vezes trabalha em equipe, atende vários pacientes, é pago pelos seus cuidados e recebe treinamentos. Contudo, caso não seja orientado corretamente, a atividade pode ser ainda mais exaustiva com o agravamento dos sintomas, o suficiente para prejudicar tanto o paciente quanto o próprio cuidador.

Estresse do cuidador familiar: A maior parte dos cuidadores familiares são mulheres ( filhas do paciente, principalmente). São pessoas que, repentinamente, tornam-se responsáveis por um parente com dificuldades físicas e cognitivas. Estima- se que entre 60% e 70% ( dados variam bastante, atingindo até além dos 80%, dependendo do estudo) dos cuidadores familiares apresentam estresse e problemas médicos e psiquiátricos. A medida que a doença evolui, os sintomas tendem a se agravar, o que leva a sobrecarga do cuidador familiar, o qual deverá dispor de mais tempo para atender a demanda crescente das necessidades do enfermo. Apresentam, desse modo, maiores riscos de desenvolverem depressão, ansiedade e dependência química, além de isolamento social. É interessante lembrar que, na América Latina, há uma cultura em que os filhos devem cuidar dos pais quando estes envelhecerem. A “obrigação moral” de se tornar um cuidador familiar, nesses casos, pode ser um fator agravante do estresse, uma vez que o descendente encontra-se preso e responsável numa situação em que não gostaria de estar.

  1. Principais instrumentos utilizados na avaliação do estresse do cuidador

Uma das discussões relevantes no campo da saúde mental do cuidador em demência é o desenvolvimento de estratégias para o diagnóstico precoce do estresse e outras alterações do humor nestes indivíduos.  A auto percepção de saúde em cuidadores, pode ser conceituada como o julgamento subjetivo da própria saúde, sendo de grande valia para o monitoramento da saúde e da qualidade de vida da população, por meio de escalas e questionários.

Alguns dos principais instrumentos para obtenção de dados dos cuidadores são:

Inventário de Depressão de Beck ( BDI) – Auto aplicável, composto por 21 itens que procura investigar a presença de sintomas depressivos, tais como tristeza, pessimismo, irritabilidade, dentre outros. Cada item recebe uma pontuação de zero ( ausente) a três (grave). A pontuação total é obtida por somatório, e quando o valor é acima de 20, indica a presença de quadros depressivos

  • Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) – Assim como o BDI, apresenta 21 itens com pontuações de zero a três. O resultado é encontrado por somatório dos itens, e varia desde zero (normal) até 63 ( ansiedade grave)

  • A Entrevista de Sobrecarga de Zarit (ZBI)Composto por 22 questões  graduadas em uma escala de 0 a 4, de acordo com a presença ou intensidade de uma resposta positiva no teste. As perguntas giram em torno da relação entre cuidador e paciente e fazem um levantamento do estado de saúde física e mental, além do seu bem estar social e financeiro.

  • Inventário de Burnout de Maslach (MBI) Possui 22 itens auto aplicáveis, distribuídos em três sub-escalas diferentes, as quais fazem referência às três dimensões do burnout: EE(Exaustão Emocional), DP(despersonalização/cinismo,),RRP (Reduzida Realização Pessoal). A pontuação de cada item varia pela frequência ( de zero até seis). Encontra-se o burnout quando temos altos níveis de EE e DP e baixo nível de RRP;

     6. Como capacitar profissionais para presta atendimento adequado a pessoa com demência?

Uma das situações mais comumente encontradas na realidade brasileira e a carência de treinamento profissional e do próprio cuidador familiar para o manejo cotidiano das alterações comportamentais da pessoa com demência. Esta realidade costuma ser agravada pela exposição contínua e duradoura a diversas situações geradoras de stress, já que é grande o tempo em que estes cuidadores estão junto aos indivíduos com demência. O ambiente em si é mais exigente, e o profissional deve ser preparado para minimizar as chances de exaustão e frustração. Portanto, a forma mais plausível de se abordar o problema do estresse e sobrecarga do cuidador de pessoas com demência é através de intervenções psicoeducacionais ou psicoterapêuticas realizadas em grupos de profissionais, tais como:

A organização pode ser de diversas maneiras, como cursos, palestras ministradas por profissionais especializados e grupos nos quais os profissionais possam debater sobre seus principais estressores cotidianos, aprendendo a lidar melhor com os mesmos. Outra sugestão seria melhorar o diálogo entre os cuidadores e seus superiores, responsáveis pelo ambiente de trabalho, haja vista que mudanças no mesmo podem melhorar a relação entre cuidador e paciente, diminuindo a morbimortalidade. O profissional deve, na abordagem do SPCD, tentar antes de intervenções medicamentosas, realizar abordagens comportamentais e alterar o ambiente que rodeia o enfermo, visando uma comunicação mais clara e direta e uma redução de estímulos que podem ser interpretados como estressantes pelo paciente.

      7. Organizando os cuidados de saúde para o cuidador.

Finalmente, como foi visto, a demência é uma condição que se torna mais comum com o envelhecimento da população, sendo assim, a tendência é que o número de indivíduos incapacitados que necessitam de cuidados especiais aumente bastante. Os gastos públicos já são elevados, por volta de U$ 640 bilhões de dólares ao ano mundialmente, e existe, pela perspectiva da demanda de mercado, profissionais que saibam lidar bem e sejam capacitados para trabalhar com esse tipo de pacientes. Ademais, é necessário enfatizar e desenvolver as políticas de saúde mental voltadas para a Psicogeriatria,  promovendo o conhecimento e a desmistificação da demência e de outros transtornos mentais na terceira idade, aprendendo a diferenciar quais limitações fazem parte das limitações naturais que vêm com o envelhecimento e o que é patológico. A promoção de hábitos de vida saudáveis, por sua vez, pode influenciar positivamente, evitando ou postergando o aparecimento de sintomas deficitários.

Mais importante do que isso é ter a noção do idoso como membro efetivo da sociedade, que necessita, quando fragilizado, dispor de meios que possam dar assistência a si e ao seu cuidador. Portanto,  não há como desvincular as medidas terapêuticas e de cuidado com os pacientes com demência e seus cuidadores da atual política de saúde mental. É necessária a atuação conjunta de diversos setores envolvidos neste campo a fim de redefinir prioridades, como o reconhecimento precoce dos casos de demência, a atuação interdisciplinar no seu tratamento, a formação de centros de orientação aos familiares e a educação continuada aos profissionais envolvidos neste processo.

Sugestão de leitura

BURLÁ, C.  et al. Panorama prospectivo das demências no Brasil: um enfoque demográfico. Cien Saude Colet, v. 18, n. 10, p. 2949-2956, 2013 2013.

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CARAMELLIA, P.; BARBOSAB, M. T. Como diagnosticar as quatro causas mais freqüentes de demência? How to diagnose the four most frequent causes of dementia? Rev Bras Psiquiatr, v. 24, n. Supl I, p. 7-10, 2002 2002.

CASSIS, S. V. A.  et al. Correlação entre o estresse do cuidador e as características clínicas do paciente portador de demência. Rev. Assoc. Med. Bras.(1992), v. 53, n. 6, p. 497-501, 2007 2007.

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TRUZZI, A. O burnout e a sobrecarga dos cuidadores familiares dos pacientes com demência: relação com os sintomas psicológicos e comportamentais da demência 2012. Tese (Doutorado em Psiquiatria) – Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 2012.

VALENTE, L.  et al. Autopercepção de saúde em cuidadores familiares e o tipo de demência: resultados preliminares de uma amostra ambulatorial. Rev Bras Neurol, v. 49, n. 1, p. 13-19, 2013 2013.