AS DIRETRIZES DOS NOVOS PARADIGMAS DO ENSINO JURÍDICO ANTE O MODELO AVALIATIVO TÉCNICO-PROFISSIONAL DOS BACHARÉIS DOS CURSOS DE DIREITO

RESUMO:

O contexto em que se desenvolve o modelo atual do ensino jurídico apresenta relação simbiótica com a necessidade de manutenção na compulsoriedade de um modelo avaliativo dos egressos dos cursos de Direito. A função social do jurista atrelada ao papel de protagonista na implementação dos direitos fundamentais e dos valores fundamentais consagrados na Constituição Federal de 1988 justifica a necessidade do repensar o ensino jurídico sob o prisma de aferição da capacidade técnico-profissional dos bacharéis em Direito. A construção de um modelo prospectivo do ensino jurídico perpassa necessariamente pelo reconhecimento e validade de novos direitos, bem como pela constitucionalização das relações jurídico-privadas, atrelada às exigências sociais  tendencialmente inclusivas no exercício efetivo da cidadania. A dinamicidade imanente ao Direito assume uma nova feição no que diz respeito ao ensino jurídico como mecanismo de cognoscibilidade dos direitos fundamentais na ambiência do pós-positivismo. Ao contrário dos paradigmas tradicionais que dominaram diversas gerações de juristas, a Ciência do Direito é essencialmente antidogmática, mormente no tocante à criação e adaptação de mecanismos voltados à operabilidade e compreensão de novas questões e a superação de antigos paradigmas na construção de um modelo pedagógico fundado nos valores da democracia e da justiça.

PALAVRAS- CHAVE: PARADIGMAS; ENSINO JURÍDICO; MODELO AVALIATIVO; CURSOS DE DIREITO.

MODEL; COURSES OF LAW.

 

INTRODUÇÃO

 

No modelo tradicional, o ensino jurídico é analisado sob o prisma reducionista do legalismo positivista, exegético e dogmático, olvidando-se do caráter essencialmente dinâmico da Ciência do Direito.

A superação desse paradigma exegético-dogmático implica no reconhecimento de um ensino jurídico vivo e mutante, essencialmente dinâmico ao servir ao relevante papel de mecanismo fundamental de realização da justiça no Estado Democrático de Direito.

Desde a sua origem o ensino jurídico brasileiro apresenta-se como um mecanismo de reprodução da ideologia e dos institutos no modelo europeu-continental, fruto do antropocentrismo cartesiano voltado ao tecnicismo impeditivo de reflexões ontológicas que possibilitem mudanças sociais estruturais.

Em um contexto de crise e defasagem estrutural do ensino jurídico a aprovação no exame da OAB (modelo avaliativo-profissional dos egressos dos Cursos de Direito), serve de mecanismo eficaz para garantia de legitimidade do profissional jurídico e para o jurisdicionado.

1.2. ENSINO JURÍDICO NO BRASIL: EVOLUÇÃO HISTÓRICA E DIAGNÓSTICO NO CONTEXTO  DA CONTEMPORANEIDADE

A importação dos ensinamentos na educação doméstica ministrada por preceptores europeus nas classes dominantes implicou em uma desvalorização do nacionalismo na formação histórica dos países da América Latina. Os valores cultuados pelas elites eram de matriz eurocêntrica. Existia basicamente a reprodução de algumas características da cultura externa, com a rejeição da cultura pátria, o que acabou por retardar o verdadeiro sentimento de nação. A política e a educação reproduziam a subserviência dos valores sociais, reverberando na submissão econômica e social, apesar de toda uma gleba de riquezas étnico-culturais oriundas dos povos ancestrais.

Neste contexto, as minorias sociais e econômicas (negros e ameríndios) continuavam excluídas do acesso social à educação. No século XIX, o Estado monárquico brasileiro, já consolidado, criou algumas escolas destinadas à inclusão dos membros da elite na organização da burocracia estatal, mas não houve qualquer programa de educação das massas ou de grupos subalternos, sem maior expressão política, fazendo com que o Brasil, segundo Darcy Ribeiro (2006, págs. 230 e 231), ainda fosse rotulado como uma nação de analfabetos:

O Estado monárquico se consolida, renova e amplia nas décadas seguintes. Anteriormente, uns quantos clérigos e administradores coloniais, uns poucos militares profissionais e bacharéis com formação universitária, graduados no Reino, podiam dar conta das necessidades. Agora, torna-se indispensável criar escolas médias e superiores que formem as novas gerações de letrados para a magistratura e o Parlamento, de bacharéis nativos, de engenheiros militares para a defesa, e de médicos para cuidar da saúde dos ricos. A cultura vulgar e, com ela, a maioria das técnicas produtivas, entregues a seus produtores imediatos, só muito lentamente começariam a modernizar-se. Como à criação das escolas para as elites não correspondeu a qualquer programa de educação de massas, o povo brasileiro permaneceu analfabeto.

Conforme assevera Boris Fausto (2010, 134) os primeiros dados gerais sobre a instrução mostram as enormes carências nessa área. Em 1872, entre os escravos, o índice de analfabetos atingia 99,9% e entre a população livre aproximadamente 80%, subindo mais de 86% os percentuais quando consideradas só as mulheres. Mesmo descontando-se o fato de que os percentuais se referem à população total, sem excluir crianças nos primeiros anos de vida, eles são bastante elevados. Apurou-se ainda que somente 17% da população entre 6 e 15 anos frequentava escolas. Havia apenas 12 mil alunos matriculados em colégios secundários. Entretanto, calcula-se que chegava a 8 mil o número de pessoas com educação superior no país.

Relativa mutação nos padrões educacionais brasileiros se deu com a inauguração dos cursos de ensino superior, com os valores meramente locais e familiares cedendo espaço a uma cultura mais regional e voltando-se à formação da burocracia estatal.

No plano da construção sociológica e antropológica da cultura brasileira permeada de valores duais, Gilberto Freyre (2011, 114 e 115) analisa com otimismo a relação travada entre o branco colonizador, o negro africano e os ameríndios:

Entre essas duas místicas- a da Ordem e a da Liberdade, a da Autoridade e a da Democracia- é que se vem equilibrando entre nós a vida política, precocemente saída do regime de senhores e escravos. Na verdade, o equilíbrio continua a ser entre as realidades tradicionais e profundas: sadistas e masoquistas, senhores e escravos, doutores e analfabetos, indivíduos de cultura predominantemente europeia e outros principalmente de cultura africana e ameríndia. E não sem certas vantagens, as de uma dualidade não de todo prejudicial à nossa cultura em formação, enriquecida de um lado pela espontaneidade, pelo frescor de imaginação e emoção do grande número e, de outro lado, pelo contato, através das elites, com a ciência, com a técnica e com o pensamento adiantado da Europa. Talvez em parte alguma se esteja verificando com igual liberalidade o encontro, a intercomunicação e até a fusão harmoniosa de tradições diversas, ou antes, antagônicas, de cultura, como no Brasil. É verdade que o vácuo entre os dois extremos ainda é enorme, e deficiente a muitos respeitos a intercomunicação entre duas tradições de cultura. Mas não se pode acusar de rígido, nem de falta de mobilidade vertical – como diria Sorokin- o regime brasileiro, em vários sentidos sociais um dos mais democráticos, flexíveis e plásticos.

No plano jurídico observa-se que a colonização política reverberou no âmbito da construção da legislação, do ensino jurídico e das instituições, que, muitas vezes plasmaram-se em verdadeiras cópias das pré-existentes no sistema europeu continental. Mais uma vez reproduzia-se na América Latina um sistema importado e pouco adaptado aos anseios populares.

Para Keith S. Rosenn (1998, 61) vários fatores explicam a preponderância do formalismo no Brasil e, na verdade, em vários outros países latino-americanos também. A independência trouxe pouco alívio relativamente a leis inadequadas para as expectativas da sociedade brasileira. Em geral as leis brasileiras nunca foram autócnes. A maioria delas foi transplantada em massa da Europa ou dos Estados Unidos, infelizmente com pouca preocupação com a sua adaptabilidade às necessidades do Brasil.

No mesmo sentido Antônio Carlos Wolkmer (2010, 146 e 147) aduz: não é por demais relevante lembrar que, na América Latina, tanto a cultura jurídica imposta pelas metrópoles ao longo do período colonial, quanto as instituições jurídicas formadas após o processo de independência (tribunais, codificações e constituições) derivam da tradição legal europeia, representada, no âmbito privado, pelas fontes clássicas dos Direitos romano, germânico e canônico. Igualmente, na formação da cultura jurídica e do processo de constitucionalização latino-americanos pós-independência, há de se ter em conta a herança das cartas políticas burguesas e dos princípios iluministas inerentes às declarações de direitos, bem como provenientes agora da nova modernidade capitalista, de livre mercado, pautada na tolerância e no perfil liberal-individualista. Nesse sentido, a incorporação do modo de produção capitalista e a inserção do liberalismo individualista tiveram uma função importante no processo de positivação do Direito estatal e no desenvolvimento específico do Direito público das antigas colônias ibéricas. Cabe reconhecer que o individualismo liberal e o ideário iluminista dos Direitos do Homem penetraram na América hispânica, no século XIX, dentro de sociedades fundamentalmente agrárias e, em alguns casos, escravagistas, em que o desenvolvimento urbano e industrial era praticamente nulo. Desse modo, a juridicidade moderna de corte liberal vai repercutir diretamente sobre as estruturas institucionais dependentes e reprodutoras dos interesses coloniais das metrópoles. Tem sido próprio na tradição latino-americana, seja na evolução teórica, seja na institucionalização formal do Direito, que as constituições políticas consagrassem, abstratamente, igualdade formal perante a lei, independência de poderes, soberania popular, garantia liberal de direitos, cidadania culturalmente homogênea e a condição idealizada de um “Estado de Direito” universal. Na prática, as instituições jurídicas são marcadas por controle centralizado e burocrático do poder oficial; formas de democracia excludente; sistema representativo clientelista; experiências de participação elitista; e por ausências históricas das grandes massas campesinas e populares. Certamente, os documentos legais e os textos constitucionais elaborados na América Latina, em grande parte, têm sido a expressão da vontade e do interesse de setores das elites hegemônicas, formadas e influenciadas pela cultura europeia ou anglo-americana.

Observa-se que a ideologia inspiradora da gênese do ensino jurídico brasileiro era a segurança jurídica plasmada na perpetuação dos interesses sócio-políticos na formação da elite nacional que necessitava ocupar cargos políticos na nascente organização burocrático-estatal. Após tantas mudanças contextuais, pode-se afirmar que há um novo ensino jurídico, cujo fundamento é a efetividade da democracia e da dignidade da pessoa humana na medida em que serve de mecanismo ético e garantidor do respeito e convivência harmoniosa entre os diversos grupos componentes da sociedade.

O bacharelismo foi uma característica marcante desde a sua gênese no período do Brasil Imperial. Com a Independência, o país herdou forte tradição escravista e ruralista. Fez-se necessário a criação de ideologia para que o Estado recém-nascido pudesse ocupar espaços legislativos, administrativos e jurídicos então vacantes. Um grande complicador neste desiderato é que no século XIX o Brasil era conhecido como um país de analfabetos.

Até o ano de 1823, ao menos no cenário legislativo do Império, não se aventava a ideia da criação de cursos jurídicos no Brasil, ao oposto da América espanhola, que ao final da fase colonial possuía mais de vinte universidades, sendo certo, de que as duas primeiras, foram instaladas em São Domingos, na atual Republica Dominicana e em Lima, no Peru, a América portuguesa (Brasil), não dispunha de nenhuma instituição de ensino superior, toda formação acadêmica, na área do direito, ocorria na Universidade de Coimbra (NASPOLINI SANCHES, Samyra. H. D. F.; BENTO, Flávio, on line e VENÂNCIO FILHO, Alberto, 1978, 13).

Logo no início da vida político-institucional brasileira a alternativa mais crível foi o aproveitamento nos cargos públicos dos bacharéis egressos das elites rurais, com formação em Coimbra. Em um estádio mais avançado surgiram os primeiros Cursos de Direito no Brasil, quais sejam: São Paulo e Olinda/Recife, cujos discentes regra geral eram oriundos das classes dominantes (desejosas de manutenção e aumento dos privilégios político-econômicos).

Consoante Sérgio Buarque de Holanda[2], no Brasil, com o vício do bacharelismo, ostenta-se a tendência para exaltar a personalidade individual. A origem da sedução exercida pelas carreiras liberais vincula-se ao apego brasileiro aos valores da personalidade, desembocando em uma ânsia pelos meios de vida definitivos, que atribuem segurança e estabilidade, sem um mínimo de esforço pessoal, como sucede frequentemente no tocante aos cargos públicos.

Para Boris Fausto (2010, pág. 134) do ponto de vista da formação da elite, o passo mais importante foi a fundação das faculdades de direito de São Paulo (1827) e de Olinda/Recife (1828). Delas saíram os bacharéis que, como magistrados e advogados, formaram o núcleo dos quadros políticos do Império.

Acerca da reforma do ensino jurídico na República Velha afirma Alberto Venâncio Filho (1978, 25 e 26) que o episódio mais importante do início da República, em matéria de ensino jurídico, é a concepção do denominado federalismo educacional, ao lado do federalismo político que a Carta de 1891 desejava introduzir. A reforma Benjamin Constant retoma sob novas bases a criação dos cursos e das faculdades livres, que começavam a surgir em vários estados, quebrando assim o duopólio das tradicionais escolas de Recife e São Paulo. A primeira é a da Bahia (1891), logo se seguindo no Rio de Janeiro a criação da Faculdade Livre de Direito (1891) e a Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais (1891). Em 1892 criou-se a Faculdade Livre de Direito de Minas Gerais. Na década seguinte, surgem as Faculdades de Direito do Pará, em 1902, do Ceará, em 1903 e do Amazonas, já na outra década, em 1912[3].

Consoante o diagnóstico de Keith S. Rosenn (1998, pág. 62) a educação jurídica brasileira tem sido basicamente formalista. Uma importância quase exclusiva é dada à exegese clássica de textos legais formais. Pouca atenção é dada ao exame como as normas funcionam na prática. O estudo jurídico tem se concentrado na compreensão de normas legais e tem ignorado a conduta das pessoas afetadas por essas normas.

Sobre o ensino jurídico da década de 1930 a 1970 aduz Alberto Venâncio Filho (1978, pág. 31) que este nunca colheu resultados concretos da reforma. Até 1945, o panorama se conserva o mesmo, mas depois dessa data, com a reconstitucionalização, surge uma grande aspiração pelo ensino superior, com a federalização do grande número de faculdades e a criação de escolas particulares por quase toda a parte. Seja na fase do Conselho Nacional de Educação, seja a partir do funcionamento do Conselho Federal de Educação em 1962, ambos os órgãos incumbidos da autorização para funcionamento das novas faculdades, verificar-se-á que nenhum dos dois se aparelhou devidamente para executar esta tarefa, e assiste-se à política da mais pura espontaneidade, onde, com raras exceções com a multiplicação de escolas sem a mínima categoria profissional.

De fato não se pode olvidar que a educação jurídica brasileira ainda é essencialmente dogmática e exegética, resumida a uma análise meramente legalista e reducionista na apreensão do Direito na perspectiva de Ciência Social Aplicada.

A necessidade de disciplinas propedêuticas interdisciplinares nos Cursos Jurídicos é exposta por Keith S. Rosenn (1998, pág. 63) ao asseverar que a inquirição do cientista jurídico ser quase que exclusivamente direcionada para a norma legal. Embora ele possa parecer dar atenção a fatos derivados de disciplinas não jurídicas, como antropologia, sociologia, ciência política ou econômica, o cientista jurídico na realidade ignora fatos não jurídicos porque eles afastam de sua busca de princípios absolutos e da verdadeira natureza das instituições legais.

Consoante aduz José Eduardo Faria (1988, 14 e 15) como a história do direito é, também, a história das contradições sociais, assiste-se hoje a um amplo e intrincado processo de revisão dos próprios pressupostos metodológicos da teoria jurídica – processo esse resultante da própria evolução do sistema social em que ela está inserida. Em face das formas coletivas de conflito emergentes dos novos níveis de correlação de forças entre grupos e classes sociais em luta, os conceitos básicos da Ciência do Direito foram perdendo sua operacionalidade.

De acordo com Alberto Venâncio Filho (1978, 33) a formação haurida nas faculdades de direito deixou o bacharel despreparado para as novas tarefas que a sociedade brasileira exige do profissional do direito, e, incapacitado de dar respostas a essas formulações, mergulha ele numa atitude de ressentimento e de frustração altamente prejudicial.

Para José Eduardo Faria (1988, 16) ao rejeitar reflexões epistemológicas capazes de integrar a Ciência do Direito no âmbito das ciências sociais, o idealismo desenvolve conceitos falsamente explicativos que não só encobrem a proteção formal daqueles valores, mas que, igualmente, servem como elementos organizadores do próprio discurso jurídico, com funções ideológicas definidas: despertar nos indivíduos a confiança nas leis e nos códigos como um sistema legítimo de institucionalização e resolução dos conflitos. Por intermédio do idealismo tem-se a ilusão de compreender e superar os antagonismos e tensões através de soluções jurídicas, garantindo-se então a coesão social e assegurando-se o consenso em torno das instituições políticas. Conceitos como os de direitos humanos, igualdade perante a lei, autonomia da vontade, sujeito de direito, liberdades públicas, garantias processuais e decisão judicial transitada em julgado têm, assim, o poder de servir para uma construção aparentemente harmonizante  das relações sociais, nas quais todos os antagonismos são conciliáveis pela ordem jurídica.

Observa-se que os cursos jurídicos na contemporaneidade apresentam três grandes diferenças contextuais em relação à sistemática implantada no Século XIX e início do Século XX, quais sejam: são acessíveis às classes populares e não mais apenas para as elites; são menos custosos aos estudantes e não mais se destinam exclusivamente à formação dos quadros da burocracia estatal (pelo menos em sua maioria). Sob o viés ideológico, no entanto vislumbra-se que os cursos jurídicos na atualidade continuam, em sua maioria, com a perpetuação da mentalidade ideológica outrora unânime de restrição do conhecimento da Ciência do Direito ao reducionismo do paleopositivismo e ao falso jusnaturalismo normativo, com cursos e currículos menoscabados à abordagem normatizada nos Códigos, alheios ao construtivismo crítico, na limitação estrita da descrição das regras com a reprodução dos elementos sociais dominantes de forma a perpetuar os interesses conservadores das classes detentoras do poder.

No diagnóstico de José Eduardo Faria (1988, 17) a identidade entre Estado e direito é um bom indicativo de como o idealismo envolveu a dogmática jurídica. A intensidade foi tanta que, com o tempo, terminou por estabelecer uma saber especializado difusamente presente na trama de todas as relações sociais e nas múltiplas instituições, privadas ou públicas- das famílias e da empresa aos tribunais. Ou seja: um complexo conjunto de representações funcionais, classificado em disciplinas específicas e legitimado por discursos produzidos por órgãos institucionais, como o Legislativo, o Judiciário, as faculdades de direito, as associações profissionais e a própria burocracia estatal.

Para Antônio Alberto Machado (2009, 128 e 129) a leitura e o ensino dos códigos, de modo acrítico e irreflexivo, completamente desvinculada de suas condicionantes sociais e econômicas, acaba mesmo por reproduzir, no plano jurídico, uma certa lógica de controle e dominação social que já está previamente formalizada nos estatutos legais. Por isso, as ideias da neutralidade e de um direito sem ideologia, ensinadas como critérios seguros para a realização da justiça, não passam de mitos invariavelmente a serviço de interesses de classes, que o jurista incorpora como probidades hermenêuticas do sistema, reproduzindo-os acriticamente. A apregoada pasteurização da dogmática como um corpo normativo sem ideologia e politicamente asséptico, apreendido pelo método lógico-formal e sem fundamentantes na base material da sociedade, identifica legalidade com legitimidade e orienta a investigação científica apenas para os problemas da vigência, validade e eficácia da norma. É justamente por meio dessa estratégia legalista que o projeto pedagógico do ensino jurídico circunscreve o universo do jurista aos limites normativos estatais e oculta as relações de dominação “legalizadas” pelo ordenamento jurídico positivo. O ensino descritivo dessa ordem jurídica, nos moldes preconizados pela mentalidade positivista, com toda a sua objetividade científica, estrutura-se pelo silogismo clássico em que a premissa maior (norma) aparece já como um “dado” que condiciona mecanicamente o intérprete e escamoteia a força monopolizada pelo poder normativo, entregue politicamente aos representantes da classe que detém o poder econômico e a hegemonia ideológica na sociedade burguesa.

A herança dogmática e juspositivista do ensino jurídico, reverbera até os dias hoje, motivo pelo qual diversos conteúdos programáticos diluídos nas matrizes curriculares em vários cursos jurídicos limita-se à reprodução da divisão realizada pelos Códigos, transplantando-se para as informações contidas nos manuais adotados nos cursos de graduação. Estes livros assumem um conteúdo com informações meramente instrumentais e reprodutoras dos velhos cânones que informaram o dogmatismo jurídico sem a criticidade que deve ser buscada pelo paradigma zetético da Ciência do Direito no contexto do pós-positivismo.

  1. 3.                  PARADIGMAS CONTEMPORÂNEOS PARA A SUPERAÇÃO DA CRISE NO ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO

Aduz José Eduardo Faria (1988, 23)em termos históricos, a transição dos antigos para os novos paradigmas da dogmática jurídica foi deflagrada pela emergência do modo capitalista de produção, isto é, pela substituição do capital concorrencial pelo capitalismo monopolista; e foi acelerada pela institucionalização de novas formas organizacionais no âmbito do Estado Liberal, mediante a consolidação de anéis burocráticos que ampliaram sua capacidade de direção e controle do processo produtivo visando reajustá-lo estruturalmente às novas exigências da lógica do capital. Daí, subjacente ao aumento do poder discricionário do Executivo e à “tecnicização” do poder político, a “publicização” do direito privado e a “administrativização” do direito público, de um lado dissolvendo a tradicional rigidez hierárquica inerente à dogmática jurídica moderna e, de outro, trazendo consigo a ideia de legitimação mediante resolução dos problemas econômicos. A ruptura da divisão das fronteiras entre o direito privado e a assunção da titularidade de iniciativa legislativa pelas agências do Executivo se dá, basicamente, pela expansão das normas de organização: aquelas com as quais o Estado regula as suas próprias atividades. Eis por que, enquanto os paradigmas clássicos da dogmática acabaram corroídos pelas sucessivas críticas ao idealismo comum, ao jusnaturalismo racionalista e ao formalismo positivista, os paradigmas emergentes, gradativamente foram sendo consolidados por modelos analíticos mais abrangentes e mais sensíveis à (re) conciliação da Ciência do Direito com as demais ciências sociais.

Como fruto da reprodução de uma ideologia estanque e reducionista, fundada na dogmática juspositivista surge o cenário de crise no ensino jurídico brasileiro. A ideologia acadêmica estava totalmente descompromissada com a possibilidade de um espírito científico propositivo e inovador.

Conforme explicitado por José Eduardo Faria (1988, 19) a exigência de dialetização entre prática social e racionalidade formal entreabre a necessidade de revisão de categorias e conceitos falsamente transparentes. Mostra, igualmente, a importância das abordagens interdisciplinares no exame da experiência jurídica atual. Afinal, a compreensão da organização e do funcionamento das estruturas sociais implica a percepção da totalidade de suas significações, sem o que não há como se descobrir o conjunto de elementos determinantes que explica os comportamentos, os hábitos, as obediências, as submissões- enfim, as diferentes formas de sociabilização e integração dos indivíduos, trivialização e neutralização das tensões e exclusão dos conflitos e repressão de seus responsáveis. Sem esse tipo de compreensão, a Ciência do Direito não poderá suas contradições atuais nem ser reintegrada no conjunto das ciências sociais. E estas, por sua vez, refletindo os inevitáveis dilemas da sociedade de classes, encontram-se também numa crise de identidade. De um lado, advoga-se uma ciência social capaz de abarcar a totalidade da situação humana, de apreender natureza e personalidade, estrutura e dinamismo, economia e sociedade, ideologia e verdade, o movimento histórico efetivo como legação entre o passado e o presente e como criação do futuro.

Faz-se necessária a superação do legalismo exegético-dogmático no ensino jurídico, mormente no tocante à conscientização e educação dos direitos fundamentais em todas as suas dimensões (individuais, sociais ou coletivos) uma vez que a concretização dos aludidos direitos ocorre em diversos âmbitos.

Repercutem como novo paradigma do ensino jurídico as transformações epistemológicas e hermenêuticas acabaram por atribuir uma nova feição aos direitos fundamentais, com uma concepção cada vez mais democrática e aberta aos anseios emanados dos grupos sociais (ainda que minoritários).

O discurso jurídico sobre a evolução jurídica dos direitos fundamentais é repleto de visões maniqueístas, pois trata de opções econômicas que tendem a se converter em ideologias por grupos que ascenderam social e politicamente. Esta foi a concepção extraída a partir da história do constitucionalismo europeu clássico, fruto das conquistas burguesas que trataram de imprimir segurança jurídica aos institutos sobre os quais se assentavam as suas atividades profissionais.

Segundo Antonio Enrique Perez Luño (2007, 20/21)[4] em seu significado objetivo axiológico os direitos fundamentais representam o resultado do acordo básico das diferentes forças sociais, feita a partir de relações de tensão e os esforços posteriores para colaborar na consecução de objetivos comuns. Portanto, corresponde aos direitos fundamentais um papel importante para legitimar as formas constitucionais do Estado de Direito, assim como o consenso que constituem pressupostos sobre as quais construir uma sociedade democrática, em outras palavras, a sua função é sistematizar o conteúdo axiológico objetivo do sistema democrático que a maioria das pessoas dão o seu consentimento e condicionam o seu dever de obediência à lei. Também envolvem a garantia essencial de um processo político livre e aberto, como um repórter de uma sociedade pluralista.

A consagração dos direitos fundamentais (vida, liberdade, igualdade, propriedade etc) nos textos jurídico-constitucionais representa uma nova concepção da própria educação ministrada nos cursos jurídicos: doravante, haverá a primazia do social sobre o individual o que representa o inverso do quadro jurídico anterior marcado pelo liberalismo abstencionista estatal.

Acerca da proteção dos direitos fundamentais pelo poder judicial aduz Konrad Hesse (1998, 269) que para assegurar a eficácia dos direitos fundamentais, prevê o direito vigente, por último, um controle amplo de sua observância pelo poder judiciário. Esse controle serve não só à proteção jurídica individual, portanto, à realização dos direitos fundamentais como direitos de defesa subjetivos, mas, não menos, também, à sua proteção como partes integrantes da ordem objetiva da coletividade, que deve ser realizada pelos tribunais independentes vigiarem a observância dos direitos fundamentais.

Os direitos fundamentais (que abrangem os direitos humanos constitucionalizados) surgem e se desenvolvem a partir das Cartas Constitucionais nas quais foram reconhecidos e assegurados, carecedores de implementação pelos Poderes Constituídos dos Estados através de políticas públicas, bem como da necessidade do advogado como figura vetorial e propulsionadora do ativismo jurisdicional.

Consoante o diagnóstico de Dieter Grimm (2006, 106)[5] a função diretiva dos direitos fundamentais, inicialmente considerada como provisória, hoje torna-se tarefa permanente, uma vez que os componentes dos direitos fundamentais que vão além do status quo resultam ainda mais importantes do que garantir isso. Os direitos fundamentais atuam como um sinal de alarme, incorporado ao ordenamento jurídico, dos déficits de liberdade do direito válido e como princípio dinâmico de reajuste do direito.

Os direitos e as garantias fundamentais apresentam uma textura aberta, razão pela qual podem ser executados e concretizados de múltiplos modos com a participação proativa do profissional jurídico egresso de um ensino jurídico comprometido com a realidade social aberta, viva e transformadora.

Os novos paradigmas do ensino jurídico sob o ângulo da relação dialética travada entre direitos fundamentais e constitucionalização do direito são analisados a partir do prisma de mecanismo propiciador de respostas jurisdicionais justas e efetivas na resolução das demandas sociais. Neste contexto jurídico-epistemológico eis que avulta em importância a necessidade de revisão do ensino jurídico à luz da necessidade de formação de profissionais comprometidos com a transformação de velhos e arraigados vícios jurídico-institucionais como práticas burocráticas e excludentes.

A abertura do ensino jurídico aos ditames contidos nos direitos fundamentais, bem como na constitucionalização imanente à Ciência do Direito reconhece que a formação e a avaliação dos egressos nos cursos jurídicos não possui o intento de encerrar-se em si mesmo, mas sim um propósito de alcançar o verdadeiro papel, que é o de possibilitar a concretização do direito substancial de efetivo acesso à justiça.

Para Enrique R. Aftalión, José Vilanova e Julio Raffo (159/161) [6] a ciência do Direito, jurisprudência ou dogmática jurídica, é a ciência cujo objeto é o justo. Não incumbe à ciência do Direito, ao revés, investigar os seus supostos fundamentos (a natureza geral do jurídico, a natureza da conhecimento e o modo do pensamento que exercitam os juristas, o sentido último e a justificação metafísica dos dados do Direito).

Neste jaez supera-se o modelo arcaico de exagerado apego às formas, em detrimento do próprio fim, suplantam-se os movimentos tendentes a tornar o ensino jurídico como uma ciência fechada, para se tornar um legítimo instrumento crítico e construtivo de pacificação social.

Muitas dos novos paradigmas do ensino jurídico constituem-se em corolário do novo conceito de acesso à justiça, construído a partir do reconhecimento dos novos direitos e da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Conforme o escólio de Mauro Cappelletti e Bryant Garth (2002, 91) o esforço de criar sociedades mais justas e igualitárias centrou as atenções sobre as pessoas comuns – aqueles que se encontravam tradicionalmente isolados e impotentes ao enfrentar organizações fortes e burocracias governamentais. Nessas sociedades modernas, avançaram, nos últimos anos, no sentido de prover mais direitos substantivos aos relativamente fracos – em particular, aos consumidores contra os comerciantes, ao público contra os poluidores, aos locatários contra os locadores, aos empregados contra os empregadores (e os sindicatos) e aos cidadãos contra os governos. Embora se reconheça que esses novos direitos precisam de maior desenvolvimento legislativo substancial, os reformadores processualistas aceitaram o desafio de tornar efetivos os novos direitos que foram conquistados.

Os novos direitos fundamentais (em especial os sociais), espalhados pelo texto constitucional, diferem da antiga natureza dos direitos subjetivos Não se distinguem apenas por serem coletivos, mas por exigirem remédios distintos. Mais ainda, têm uma implicação política inovadora na medida em que permitem a discussão da justiça geral e da justiça distributiva (LOPES, José Reinaldo de Lima, 2005, 127).

À medida que a sociedade sofre mutações, surgem os novos direitos, muitos emergidos a partir de iniciativas emancipatórias na construção de uma democracia cidadã pluralista e inclusiva, fundada no valor justiça e na dignidade da pessoa humana (esta entendida como a base axiológica dos direitos fundamentais). O fenômeno ora em análise reverbera no plano do ensino jurídico.

Observa-se o surgimento dos novos direitos sob o prisma de uma percepção inovadora da realidade, ou seja, transfiguram-se os direitos convencionais em direitos com uma forte carga social, surgidos a partir de necessidades, conflitos e novas dificuldades de caráter sócio-político e ambiental, levantados pela presente sociedade em permanente crise, o que permite desdobramentos inovadores na formação dos profissionais jurídicos, e, em especial na pessoa do advogado (figura propulsora da atuação jurisdicional, criador de teses jurisprudenciais que, uma vez acolhidas pelo Poder Judiciário transfiguram toda uma realidade social).

Deve-se ressaltar que os novos direitos estão concatenados aos direitos que decorrem da cidadania inclusiva, e por isso, possibilitam a participação cidadã na gestão de um Estado mais democrático e participativo. Neste jaez, as novas demandas passam a existir como reclamo social permanente e modo de reivindicação do ensino jurídico em diversas facetas: direitos civis, sociais, políticos, econômicos, humanos, culturais e ambientais.

Desta forma, a partir do reconhecimento de novos direitos (em especial dos cidadãos em face do Estado, na busca de implementação dos direitos fundamentais sociais), eis que advieram novas categorias de demandas, que requerem uma sensibilidade do profissional jurídico contemporâneo no trato com os jurisdicionados, de forma a fazer valer os valores imantes ao neoconstitucionalismo inclusivo. Este novo paradigma implica na reconstrução do ensino jurídico. Dentre os novos direitos, têm-se os atinentes ao multiculturalismo e os inclusivos de políticas públicas aos grupos sociais em situação de vulnerabilidade por motivos étnicos, raciais e religiosos que dependem de profissional habilitado para a efetivação prática dessas demandas.

Para León Duguit (2007, p. 153)[7] a Declaração dos Direitos do Homem, o Código de Napoleão e todos os códigos modernos que procedem mais ou menos desses dois atos, repousam em uma concepção puramente individualista do Direito. Hodiernamente se elabora um sistema jurídico fundado sobre uma concepção essencialmente socializadora.

O ensino jurídico almejado no século XXI não pode mais continuar a regular os novos direitos (meio ambiente, bioética, biodireito, bioengenharia, consumidor, dentre outros), através de um procedimento exegético-dogmático, formalista e impessoal, faz-se premente a inclusão da sensibilidade em substituição à racionalidade cartesiana eurocêntrica. Trata-se de um ponto de mutação na metodologia do ensino jurídico na formação das gerações vindouras de juristas.

Ante o reconhecimento dos novos direitos e da eficácia horizontal dos direitos fundamentais a partir dos clamores sociais observa-se que o ensino jurídico como atualmente sistematizado encontra-se em decadência, carecedor de uma ampla reforma estrutural e transformadora.

A ambiência contemporânea do pós-positivismo informa o ensino jurídico mediante o compromisso com a exigência de justiça, diretriz esta que perpassa pelo fortalecimento da democracia, da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais subjacentes à ela.

Acerca da crise de racionalidade dominantes e a mudança de paradigmas doutrina Antônio Carlos Wolkmer (2008, 01 e 02) que as verdades teológicas, metafísicas e racionais que sustentaram durante séculos as formas de saber e de racionalidade dominantes não conseguem mais responder inteiramente às inquietações e às necessidades do presente estágio de desenvolvimento da modernidade humana. Os modelos culturais, normativos e instrumentais que fundamentaram o mundo da vida, a organização social e os critérios de cientificidade tornaram-se insatisfatórios e limitados. A crescente descrença em modelos filosóficos e científicos que não oferecem mais diretrizes e normas seguras abre espaço para se repensarem padrões alternativos de fundamentação. Os paradigmas que produziram um ethos, marcado pelo idealismo individual, pelo racionalismo liberal e pelo formalismo positivista, bem como os que mantiveram a logicidade do discurso filosófico, científico e jurídico, têm sua racionalidade questionada e substituída por novos modelos de referência. Esses novos paradigmas estão diretamente vinculados à crescente complexidade dos conflitos, à heterogeneidade socioeconômica, à concentração e centralização do capital, à expansão do intervencionismo estatal, à hipertrofia do Executivo etc. À medida que a sociedade é vista como um sistema necessariamente conflituoso, tenso e em permanente transformação, toda e qualquer análise passa a ser considerada válida apenas se for capaz de identificar os fatores de mudanças responsáveis pela contínua inadequação dos modelos culturais tradicionais- entre eles, o Direito.

Inegável que o fortalecimento dos direitos atinentes às minorias, corolário do multiculturalismo caracterizador do mundo hodierno, repercute necessariamente na problematização dos novos paradigmas dos currículos dos cursos jurídicos, corolário do reconhecimento dos novos direitos.

Uma cidadania plena, que combine liberdade, participação e igualdade para todos, é um ideal desenvolvido no Ocidente (talvez mostre-se inatingível). Mas ele tem servido de parâmetro para o julgamento da qualidade da cidadania em cada país e em cada momento histórico. Tornou-se costume desdobrar a cidadania em direitos civis, políticos e sociais. O cidadão pleno seria aquele que fosse titular das três categorias de direitos aludidas. Cidadãos incompletos seriam os que possuíssem apenas alguns desses direitos. Os que não se beneficiassem de nenhum dos direitos seriam não-cidadãos. Perpassa necessariamente pela questão da releitura da cidadania uma matriz curricular dos cursos jurídicos tendente ao acesso à justiça comprometido com os valores imanentes ao Estado Democrático de Direito.

Para Niklas Luhmann (1985, 11 e 12) o Direito torna-se cada vez mais um instrumento de mudança planificada da realidade em inúmeros detalhes. Nenhuma das culturas jurídicas anteriores à era moderna tinha essa pretensão, e muito menos essa possibilidade. O simples número das determinações assume proporções gigantescas, o que acarreta já problemas específicos que mesmo os juristas não conseguem solucionar com base na especialização material. Tal ampliação do âmbito das possibilidades jurídicas encontra sua correspondência na dimensão social.

Sobre o conceito de acesso à justiça (modo pelo qual os novos direitos tornam-se efetivos), como direito social fundamental, impregnado dos valores imanentes aos direitos humanos fundamentais, vale ressaltar as ideias de Mauro Cappelletti e Bryant Garth (2002, 12 e 13) consoante as quais, têm-se: (a) técnicas processuais servem a funções sociais; (b) as cortes não são as únicas formas de solução de conflitos a ser considerada e (c) qualquer regulamentação processual tem um efeito importante sobre a forma como opera a lei substantiva.

Para Mauro Cappelletti e Bryant Garth (2002, 76), pelo menos desde o início do século XX, tem havido esforços importantes no sentido de melhorar e modernizar os tribunais e seus procedimentos.

Tais mutações na cultura judiciária perpassam necessariamente por uma reformulação dos cursos jurídicos na formação de advogados abertos às transformações sociais. Em um plano mais voltado ao acesso à justiça observa-se uma maior abertura do Poder Judiciário aos direitos humanos outrora violados. Busca-se uma cultura judiciária plural, democrática, cidadã e aberta às demandas de grupos historicamente colocados à margem do processo decisório.

Para Danielle Annoni (on line)  neste contexto, o Estado deixa de ser o único responsável pela efetividade dos direitos consagrados e passa a ser o principal ator-conciliador das necessidades dos mais distintos grupos sociais, associando-se e promovendo a participação ativa e integrada de outros atores sociais e políticos, representados pela iniciativa privada, nacional e internacional, pelo terceiro setor, pelos grupos de pressão e pelos nascentes movimentos sociais. Vislumbra-se, portanto, um repensar o Direito para abraçar também o direito não estatal, reconhecendo e fomentando novas práxis no exercício da cidadania, em busca de uma democracia pluralista e global. A construção de uma democracia pluralista não implica, por evidente, em reconhecer e legitimar práticas violadoras de direitos e garantias fundamentais. Antes o contrário, visa fomentar a participação social, o exercício pleno e efetivo da cidadania, destacando, não os direitos, mas o dever da sociedade e de cada grupo indistintamente de trabalhar em prol da concretização dos direitos de todos. Com efeito, a construção de uma democracia plural emerge da horizontalidade não apenas dos direitos, mas também do poder conferido aos sujeitos que, em condições de igualdade, possam legitimar novos instrumentos de promoção dos direitos fundamentais, tornando concreta a proteção conferida pela norma, no sentido de permitir a todos, indiscriminadamente, acesso aos mecanismos que os materializem, sejam estes jurídico-estatais ou não.

Luís Alberto Warat (1988, 72 a 74) propõe a vinculação das artes com a pedagogia e sugere o emprego didático da poética com a intenção de enriquecer poeticamente a vida dos alunos. Não pode surgir nenhuma ideia desconhecida quando se empregam os procedimentos habituais do pensamento. A história não se faz pelo conformismo. Ela depende da criação do novo. Para o referido autor é lamentável o modo em que o ensino tradicional “deserotiza” o mundo que mostra: a inviável limpidez de uma forma esquelética feita de símbolos unívocos e pretensos valores universais. É a alienação tomando conta das palavras didáticas para amarrá-las com valores utilitários e esperanças de verificação. Está-se diante de um puro sentido ideológico na medida em que suas significações se fazem verdadeiras por estarem limitadas por normas que lhes conferem, imaginariamente, o efeito de uma referência unívoca. Os textos unívocos provocam o efeito de uma linguagem naturalista que termina deixando o amargo sabor de um mundo vazio. O mundo só se transforma a partir de novas perspectivas significativas que vão alterando o que, culturalmente, se vai instituindo como realidade.

A metodologia tradicional influenciada pelo juspositivismo, que enquadra o Direito como ciência dogmática e neutra é reducionista e distanciada da realidade social e abandona o viés propositivo do Direito em detrimento da reprodução descritiva de valores ultrapassados.

Consoante aduz Keith S. Rosenn (1998, 53 e 54) a cultura jurídica brasileira é altamente legalista, ou seja, na tradição do positivismo jurídico, valoriza-se excessivamente a norma legal escrita e formal como crivo de experiência humana. A sociedade faz questão de que todas as relações sociais sejam reguladas por legislação adequada. Acha-se que, novas instituições ou práticas não devem ser adotadas, sem prévia autorização legal.

A partir do enfoque jurídico-metodológico tradicional cria-se um aspecto distorcido e alienante da realidade prática vivenciada pelo profissional do Direito.  Reduz-se a Ciência Jurídica ao conteúdo da normatização estatal e a sua cientificidade plasma-se como simples técnica de controle social.

Na década de 1.990, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) empreendeu uma campanha nacional pela melhoria do ensino jurídico e promoveu vários seminários regionais e um nacional, ocasião em que foram consolidadas propostas da comunidade jurídica, base para a edição da Portaria No.: 1.886 de 30 de dezembro de 1994, a qual oficializou a implementação no âmbito nacional de ajustes curriculares que anteviam aspectos considerados como relevantes na proposta do novo currículo para o curso de Direito. Paralelamente a isso, a OAB reformulou o Exame de Ordem, reafirmando modificações reclamadas pela comunidade de juristas, entre as quais sua uniformização e critérios mais rigorosos de avaliação e correção do desempenho dos bacharéis, exigindo deles critérios jurídico-racionais, para além da simples reprodução de códigos e peças processuais.

Como tentativa de superação das assimetrias verificadas entre a realidade prática e os currículos dos Cursos Jurídicos a Portaria No.: 1.886/1994 do Ministério da Educação estabeleceu categorias diferenciadas de disciplinas a serem ministradas. Neste sentido tem-se o disposto no Art. 6º. Corrobora neste sentido o disposto no Art. 5º- da Resolução CNE/CES No.: 09, de 29 de Setembro de 2004 que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito.

A análise das Diretrizes Curriculares Nacionais os Cursos de Direito, em geral, estabelece três eixos de formação do profissional jurídico, quais sejam: o eixo de formação geral (propedêutico), o eixo de formação profissional (técnico) e o eixo de formação prática (empírico-profissionalizante). O último assumiu a relevante tarefa de mecanismo integrativo no tocante aos demais.

O início da superação do paradigma de ensino jurídico dogmático, acrítico e de má qualidade é representado pela Portaria No.: 1886/94. Essa se revela, portanto, um documento transformador na evolução do Ensino Jurídico no Brasil, uma vez que inaugura uma série de diretrizes com o objetivo de  aprimorar efetivamente a qualidade do aludido ensino.

Até então facultativas em alguns Cursos Jurídicos, atividades complementares (tais como pesquisa, extensão e a Monografia de final de Curso), só tornaram-se compulsórias em todas as matrizes curriculares do Direito com a edição da Portaria No.; 1886/94. Até esse momento, a formação do profissional jurídica estava adstrita tão-somente ao ensino ministrado em sala de aula. A mesma deficiência se verificava no tocante ao Estágio de Prática Jurídica que, mesmo sendo de fundamental importância para a formação prática do bacharel (em todas as profissões dos operadores jurídicos, em especial à advocacia, consoante reconhecido na Portaria No.: 1886/94, na maioria dos casos resumia-se ao acompanhamento de um determinado número de audiências de instrução trabalhistas, cíveis e criminais com a elaboração de Relatórios das mesmas.

Neste jaez observa-se que a Portaria No.: 1886/94 trouxe diversos paradigmas representativos de avanços nas diretrizes curriculares dos Cursos Jurídicos que poderiam resultar em uma melhora na qualidade do Ensino Jurídico, porém o processo de implantação da Portaria implica em uma mudança de práticas e ideologias que se perpetuam por diversas gerações de juristas. A Resolução CNE/CES No.: 09, de 29 de Setembro de 2004 corrobora, atualiza e aperfeiçoa os paradigmas ventilados pela Portaria No.: 1886/94 de forma a sedimentar efetivamente uma nova realidade  para os Cursos Jurídicos.

Por longo tempo menoscabado nos currículos dos Cursos Jurídicos o Eixo de Formação Prática tem por escopo proporcionar ao discente a integração dos conteúdos teóricos e a prática profissional.

Dessa forma busca-se a construção de modelo emergente contra- hegemônico plasmado em um currículo de integração concatenado às práticas pedagógicas democráticas e emancipadoras a fim de se evitarem injustiças institucionalizadas.

A prática contra-hegemônica ocorre a partir de uma criticidade do modelo pedagógico do ensino jurídico e de uma gestão democrática, progressista e cidadã da educação, que apresenta como eixo central os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana, no reconhecimento dos novos direitos, superando-se o padrão curricular normatizado pelo Direito codificado.

Busca-se a abordagem do conteúdo de forma dialética e dialógica com outros ramos do Direito exemplificado por casuísticas solucionadas de modo interdisciplinar, construindo-se um novo objeto para a Ciência Jurídica.

A interdisciplinaridade não se realiza em um conjunto de disciplinas estanques e metodologicamente dispostas nas “grades curriculares”, o que na realidade caracteriza a multidisciplinaridade. A interdisciplinaridade é caracterizada a partir da análise do objeto de estudo a partir de diversos prismas constantes nos mais variados ramos do conhecimento em um mesmo contexto, buscando-se a apreensão de todas as facetas desse objeto, em sua inteireza. Através da abordagem interdisciplinar, o fenômeno jurídico poderá ser apreendido pelo estudante de Direito num viés holístico e transcendente ao tradicional método juspositivista, ou seja: para além da norma jurídica válida.

A metodologia convencional da ciência é representada por uma apresentação estanque e linear dos conhecimentos, bem como dissimula a ruptura entre a ciência contemporânea e as visões diversificadas da realidade, inclusive com o resgate das tradições culturais dos povos autócnes, superando-se a ideologia tipicamente eurocêntrica, racional-antropocêntrica e cartesiana.

A abordagem interdisciplinar apresenta-se como um dos paradigmas emergentes na superação da crise do ensino jurídico. Neste jaez tem-se o reconhecimento de novos métodos pedagógicos harmonizados com os avanços científicos e com as tradições culturais das minorias étnico- raciais, fundamentais na construção de uma prática jurídica inclusiva e cidadã.

Neste novo paradigma para superação da crise do ensino jurídico eis que o professor assume a importante função de elemento de ligação entre as ideias críticas, as tradições, as disciplinas e os valores da esfera pública na prática quotidiana. De modo simultâneo os educadores devem assumir a responsabilidade de relacionar a abordagem didática às questões sociais mais amplas na construção de uma análise crítica por parte dos discentes, capacitados ao desenvolvimento de uma análise científica na análise dos problemas sociais e agente social participativo e transformador.

No reconhecimento dos paradigmas emergentes do ensino jurídico tem-se o contributo oriundo da natureza do ato de “ensinar” (atividade dialética de relevante caráter social, compromissada com o progressismo e a humanização das relações sociais), fundado em parâmetros éticos, políticos e sociais da atividade docente para com os discentes, a qual se realiza em determinado espaço institucional e fora dele. Neste sentido, pode-se afirmar que ensinar é um projeto coletivo que deve ser compatibilizado com o princípio da liberdade de cátedra.

É necessário construir-se um modelo de ensino jurídico emancipador, crítico e interdisciplinar fundando-se na verificação do Direito qualificado como Ciência Social Aplicada, na dignidade da pessoa humana e no respeito às diferenças culturais, plasmado em uma matriz curricular cujos conteúdos estão ligados a um eixo mais amplo, na formação de um ato democrático- dialógico em substituição ao paradigma autocrático-isolacionista.

Tal proposição se coaduna com o reconhecimento de um currículo de integração consoante o qual o conhecimento está organizado em conteúdos abertos que se entrecruzam em torno de uma questão central e integradora (por exemplo, os direitos humanos), no qual diferentes professores encontram-se envolvidos numa tarefa pedagógica comum. No modelo tradicional o currículo é estanque, reducionista e isolacionista, no qual não se estabelece um liame no conteúdo ministrado de forma que as práticas pedagógicas são prejudicadas pela ausência de diálogo.

No diagnóstico de Horácio Wanderley Rodrigues (1988, 107 a 111) o problema do ensino jurídico não se reduz a questões curriculares e didático-pedagógicas. Currículo e metodologia do ensino são meras consequências de uma estrutura de pensamento e de uma prática já estabelecidas; são consequências do senso comum teórico dos juristas. A interdisciplinaridade não se realiza em um conjunto de disciplinas estanques – isto é multidisciplinaridade- mas sim na análise do objeto a partir de categorias pertencentes a vários ramos do conhecimento em um mesmo momento, buscando apreender todos os aspectos deste objeto, em sua integridade. A pretensão de mudar o ensino jurídico através da alteração do currículo do curso é falsa. Se a qualificação docente se restringir a uma qualificação dogmática- unidisciplinar e legalista- esta apenas servirá para reforçar o status quo. O mestre que domina totalmente o conteúdo dogmático de sua disciplina pode ser um “bom professor”, mas nunca será um educador. Será o dono da verdade e não cumprirá a sua função de educador, que é a de atribuir ao aluno apenas os instrumentos- as categorias- necessários para que este se autodesenvolva. Profissionalizar os egressos dos cursos jurídicos, neste momento histórico, deve ser prepará-los para enfrentar essa realidade. É colocá-los a serviço da sociedade, em busca da justiça social efetiva. É transformar o Direito em instrumento de libertação. É necessária a troca do paradigma dominante na Ciência do Direito. É necessário construir um novo objeto para a ciência e o ensino jurídicos, voltando-os para a realidade vigente. E para isto é preciso negar todos os paradigmas que se têm alternado historicamente como dominantes no pensamento jurídico.

A construção de um Plano Político Pedagógico efetivamente democrático é um importante paradigma na superação dos vícios clássicos existentes no ensino jurídico brasileiro. Com a Constituição Federal de 1988 a institucionalização do processo democrático reverberou nos mais diversos espaços, em especial na universidade.

Aduz Norberto Bobbio (2011, págs. 155 e 156) que o processo de alargamento da democracia na sociedade contemporânea não ocorre apenas através da integração da democracia representativa com a democracia direta, mas também, e sobretudo, através da extensão da democratização- entendida como instituição e exercício de procedimentos que permitem a participação dos interessados nas deliberações de um corpo coletivo – a corpos diferentes daqueles propriamente políticos. Em termos sintéticos, pode-se dizer que, se hoje se deve falar de um desenvolvimento da democracia, ele consiste não tanto, como erroneamente muitas vezes de diz, na substituição da democracia representativa pela democracia direta (substituição que é de fato, nas grandes organizações, impossível), mas na passagem da democracia na esfera política, isto é, na esfera que o indivíduo é considerado como cidadão, para a democracia na esfera social, onde o indivíduo é considerado na multiplicidade de seu status, por exemplo de pai e de filho, de cônjuge, de empresário e de trabalhador, de professor e de estudante, de médico e de doente, de oficial e de soldado, de administrador e de administrado, de produtor e de consumidor, de gestor de serviços públicos e de usuário etc.; em outras palavras, na extensão das formas de poder ascendente, que até então havia ocupado quase exclusivamente o campo da grande sociedade política (e das pequenas e muitas vezes politicamente irrelevantes associações voluntárias), ao campo da sociedade civil em suas várias articulações, da escola à fábrica. Em consequência, as formas hodiernas de desenvolvimento da democracia não podem ser interpretadas como a afirmação de um novo tipo de democracia, mas devem ser bem mais entendidas como a ocupação, por parte de formas até tradicionais de democracia, de novos espaços, isto é, de espaços até então dominados por organizações de tipo hierárquico ou burocrático.

Acerca do processo democrático imanente às universidades esclarece Boaventura de Sousa Santos (2010, 225) a universidade é a única instituição nas sociedades contemporâneas que pode pensar até às razões as razões por que não pode agir em conformidade com o seu pensamento. É que este excesso de lucidez que coloca a universidade numa posição privilegiada para criar e fazer proliferar comunidades interpretativas. A “abertura ao outro” é o sentido profundo da democratização da universidade, uma democratização que vai muito além da democratização do acesso à universidade e da permanência nesta. Numa sociedade cuja quantidade e qualidade de vida assenta em configurações cada vez mais complexas de saberes, a legitimidade da universidade só será cumprida quanto as atividades, hoje ditas de extensão, se aprofundarem tanto que desapareçam enquanto tais e passem a ser parte integrante das atividades de investigação e de ensino. Na fase de transição paradigmática, a universidade tem de ser também a alternativa à sociedade. O grau de dissidência mede o grau de inovação. As novas gerações de tecnologias não podem ser pensadas em separado das novas gerações de práticas e imaginários sociais. Por isso, a universidade, ao aumentar a sua capacidade de resposta, não pode perder a sua capacidade de questionamento.

Sobre a gestão democrática da educação aduzem Gustavo Luis Gutierrez e Afrânio Mendes Catani (2000, 62) que participar consiste em ajudar a construir comunicativamente o consenso quanto a um plano de ação coletivo.

Não se pode olvidar que outro enfoque na superação da crise do ensino jurídico traduz-se na atuação tríplice de ensino, pesquisa e extensão com papeis simbióticos e complementares. O escopo da pesquisa é a ampliação dos horizontes nos raciocínios dos estudantes, bem como na perquirição de fontes bibliográficas e empíricas fundamentais na captação e enfrentamento de problemáticas apenas superficialmente discutidas em sala de aula. Por seu turno o escopo da extensão é a prestação de contas à sociedade, ou seja, propiciar o conhecimento da realidade que cerca o estudante e desenvolve seu compromisso com a função social do Direito, na prestação de serviços úteis à evolução da comunidade. O ensino não pode ser meramente reprodutor de ideias retrógradas e alheias às transformações históricas e sociais, mas sim atender a uma metodologia propositiva e reflexiva na solução de problemas presentes para que se construa uma realidade mais justa e inclusiva.

4- NOVOS PARADIGMAS DO ENSINO JURÍDICO NA INTERCOMUNICAÇÃO COM O MODELO AVALIATIVO TÉCNICO-PROFISSIONAL DOS BACHARÉIS DOS CURSOS DE DIREITO

Na intercomunicação com a compulsoriedade do exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) observa-se que o ensino jurídico ainda é informado por matizes com ideologias eminentemente teóricas e dissociadas da realidade ao passo que o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não se atrela rigorosamente aos sistemas teóricos, pautando-se por questões práticas que confrontem o examinando com a realidade forense contemporânea.

O ensino jurídico brasileiro é ainda muito teórico, mas os aportes práticos são cada vez mais exigidos dos discentes dos Cursos de Direito. Os aspectos fundamentais para o desenvolvimento do profissional do Direito são: (1) desenvolvimento do raciocínio crítico (por exemplo no cotejo da verificação de orientações jurisprudenciais com teses controversas); (2) prática jurídica é elementar e quando feita com profissionais qualificados é um fator construtivo para a vida do futuro profissional jurídico; (3) necessidade de sensibilidade e racionalidade na formulação de corte epistemológico quando da elaboração de trabalhos científicos; (4) leitura de temas jurídicos específicos, bem como de temáticas interdisciplinares e (5) argumentação lógico- jurídica.

Tais elementos mostram-se fundamentais no desempenho da atividade do advogado que é eminentemente criativa na construção de teses jurisprudenciais posteriormente acatadas e firmadas pelo Poder Judiciário.

Os cursos de Direito, de modo específico, também se submetem à avaliação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que possui participação ativa no processo de credenciamento, reconhecimento e renovação do reconhecimento dos Cursos de Direito, condicionados à manifestação preliminar de sua Comissão de Ensino Jurídico. O próprio Exame da Ordem, realizado pelo bacharel em Direito, com a finalidade de credenciá-lo ao exercício da profissão de advogado, também apresenta a função de mecanismo de aferição da qualidade dos egressos dos Cursos Jurídicos (art. 8º-, inciso IV e §1º- da Lei No.: 8.906/94).

O ensino jurídico se democratizou, mas não tem sido capaz de manter uma qualidade esperada pela sociedade e pelos jurisdicionados. Não há que se negar o profundo impacto social da função social do Direito uma vez que o advogado será um profissional voltado à plena efetivação dos direitos humanos fundamentais e dos valores informativos da democracia brasileira.

O profissional do Direito deve ter uma visão interdisciplinar, holística e sistemática. Um dos mecanismos de aferição da capacidade do advogado é a aprovação no Exame da OAB de forma a não banalizar um ofício tão caro à implementação dos valores imanentes ao Estado Democrático de Direito consagrado na Constituição Federal de 1988.

Neste jaez tem-se a advocacia como uma profissão extremamente concatenada ao interesse público, mesmo quando exercida de forma privada, de acordo com os termos esposados pelo art. 2º-, § 1º- da Lei No.: 8906/94 (EOAB). Ademais, se o advogado não observar os valores éticos e o conhecimento jurídico adequado poderá causar danos irreparáveis ou de difícil reparação aos jurisdicionados. Destarte, a função do advogado é eminentemente social, uma vez que este é um servidor da sociedade, além de ser parte efetiva na implementação da justiça.

Observa-se que desde 1963, com o advento da Lei n° 4.215, de 27 de abril daquele ano, conforme art. 48, inciso III da aludida legislação, se exigia para a inscrição do bacharel em Direito nos quadros da OAB o “certificado de comprovação do exercício e resultado do estágio, ou de habilitação no Exame de Ordem…”

Dessa forma, em sua origem histórica, o exame de ordem era opcional, eis que se o bacharel em Direito tivesse realizado um estágio profissional não era submetido compulsoriamente à realização do exame da OAB, bastava apenas realizar outro teste, denominado exame de estágio. Deflui-se, portanto que, se o bacharel não cumprisse o estágio profissional deveria submeter-se à prova do exame de ordem.

Em 1972, contudo, a Lei n° 4.215/63 foi revogada pela Lei n° 5.842/72, que determinava em seu art. 1º que “para fins de inscrição no quadro de advogados da Ordem dos Advogados do Brasil, ficam dispensados do exame de Ordem e de comprovação do exercício e resultado do estágio de que trata a Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963, os Bacharéis em Direito que realizaram junto às respectivas faculdades estágio de prática forense e organização judiciária”.

Neste momento histórico havia, portanto, uma diferenciação entre os Cursos de Direito, aqueles que não eram equipados com escritório modelo sujeitavam-se ao regime de exame da Ordem enquanto àqueles que mantinham o aludido equipamento seus egressos não se sujeitavam ao teste da OAB.

Observa-se, portanto, que a fiscalização e a avaliação que a OAB exerce sobre os profissionais do Direito por um período superior a 50 (cinquenta) anos, porém a sua atuação foi intensificada, principalmente após a abertura para a iniciativa privada da criação de novos cursos jurídicos.

Constata-se que a crise no ensino jurídico foi intensificada pelo novo contexto sócio-político, haja vista que nesse cenário permitiu-se à iniciativa privada a criação de novos cursos de Direito, fato este que implicou na proliferação desenfreada de novos operadores jurídicos, muitas vezes despreparados para o desempenho profissional minimamente satisfatório. Nesta realidade contextual faz-se premente a necessidade de fortalecimento do exame da OAB como mecanismo de aferição da aptidão ao desempenho da atividade advocatícia.

Conforme dados publicados pela Revista Exame (on line) para os detratores, o Exame da OAB entrega a uma entidade de classe (OAB) o direito de definir quem exerce a advocacia e fere o direito à liberdade de profissão, garantido constitucionalmente. Para a OAB, é uma garantia mínima de zelar pela boa qualidade da advocacia em todo o Brasil, onde proliferam os cursos mal avaliados. Independentemente de quem está certo, o fato é que o Brasil não é o único país do mundo a adotar um exame e outras restrições aos formados em Direito. Um levantamento recentemente lançado pelo Conselho da Europa demonstra que, das 47 nações que integram a entidade, 45 não se contentam apenas com o diploma de bacharel ao exigirem mecanismos avaliativos dos egressos dos cursos jurídicos (Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Irlanda, Itália, Portugal, Rússia, Suécia, Suíça, Reino Unido e dezenas de outros). Um dos únicos países que não adotam testes para os graduados em Direito, qual seja: a Espanha, adotou em 2011 a obrigatoriedade de um curso prático e teórico, além de uma prova, para que se possa advogar. Outras 33 nações, incluindo a França, exigem ainda treinamentos contínuos dos advogados durante a carreira. Nos Estados Unidos, cada Estado aplica sua prova. A diferença é que esta está sob a responsabilidade do governo, e não de uma entidade como a OAB.

Encontram-se em trâmite no Congresso Nacional diversos projetos de leis, no sentido de reconhecer-se a inconstitucionalidade do Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O texto mais recente posto em tramitação é o Projeto de Lei No.: 2154/2011, de autoria do Deputado Federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) (on line).

Os argumentos utilizados pelo aludido parlamentar na justificativa do Projeto de Lei No.: 2154/2011 são: (1) ofensa ao Art. 5º-, incisos IX (liberdade da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença) e XIII (liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer); (2) constitucionalidade da submissão ao exame da OAB encontra-se em discussão no STF; (3) exame cria uma “obrigação absurda que não é prevista em outras carreiras, igualmente ou mais importantes”.

Os argumentos utilizados pelo Parlamentar merecem rechaço uma vez que a condição especial do advogado como profissional intrinsecamente voltado à efetivação dos valores consagrados na Constituição Cidadã justifica a exigência legal como garantia para a sociedade.

O dispositivo do Estatuto da Advocacia que estabelece a obrigatoriedade de submissão ao Exame da OAB não afronta a liberdade de ofício prevista no Art. 5º-  inciso XIII da Constituição Federal de 1988, uma vez que, quando o exercício de determinada profissão transcende os interesses individuais e implica riscos para a coletividade, cabe a limitação ao acesso à profissão em nome do interesse coletivo. O próprio legislador constituinte originário limitou as restrições de liberdade de ofício às exigências de qualificação profissional. Observa-se que o certame da OAB caminha para a necessidade de revisão e adaptações à complexidade da realidade social de modo a tornar a sua organização abordagem a mais pluralista e progressista possível (tal qual o ensino jurídico). Tal qual o ecletismo informativo nas composições das bancas examinadoras nos concursos públicos para a judicatura e para o Ministério Público que é formado por membros das mais variadas carreiras jurídicas, talvez se fizesse recomendável a presença de magistrados e promotores na elaboração e organização do exame, sem a atual organização concentrada somente nas mãos de integrantes da OAB em atendimento aos reclamos sociais democráticos e participativos, informados pela complementaridade que deve nortear o exercício de todos os matizes das profissões jurídicas. As eventuais vicissitudes do exame da OAB não retiram a sua função primordial de mostrar-se como medida adequada à finalidade a que se destina, qual seja: a aferição da qualificação técnica necessária ao exercício da advocacia em caráter preventivo, com vistas a evitar que a atuação do profissional inepto cause prejuízo ao jurisdicionado (de forma imediata) e à sociedade (de modo mediato). O desempenho da advocacia por um profissional egresso de um ensino jurídico de formação deficiente pode causar prejuízo irreparável e custar a um indivíduo as violações a todos os direitos fundamentais (liberdade, propriedade, igualdade, dentre outros).

Corrobora ainda no sentido da constitucionalidade do Exame da OAB a constatação atinente à situação de reserva legal qualificada (o exame da OAB) com uma justificativa plena de controle no descompasso entre o exame da OAB e os currículos dos cursos jurídicos.

O STF[8] reconheceu que o Exame de Ordem, inicialmente previsto no artigo 48, inciso III, da Lei nº 4.215/63 e hodiernamente no artigo 84 da Lei nº 8.906/94, no que a atuação profissional repercute no campo de interesse de terceiros, mostra-se consentâneo com a Constituição Federal, que remete às qualificações previstas em lei.

5.CONSIDERAÇÕES FINAIS

A problemática da compulsoriedade do Exame da Ordem dos Advogados do Brasil não pode prescindir da necessidade de uma abordagem do ensino jurídico. Este deve servir como mecanismo de libertação e transformação sociais, não de opressão com a reprodução de métodos dogmáticos, exegéticos e ultrapassados.

Observa-se que a ideologia inspiradora da gênese do ensino jurídico brasileiro era a segurança jurídica plasmada na perpetuação dos interesses sócio-políticos na formação da elite nacional que necessitava ocupar cargos políticos na nascente organização burocrático-estatal. Após tantas mudanças contextuais, pode-se afirmar que há um novo ensino jurídico, cujo fundamento é a efetividade da democracia e da dignidade da pessoa humana na medida em que serve de mecanismo ético e garantidor do respeito e convivência harmoniosa entre os diversos grupos componentes da sociedade.

Como fruto da reprodução de uma ideologia estanque e reducionista, fundada na dogmática juspositivista surge o cenário de crise no ensino jurídico brasileiro. Tradicionalmente, a ideologia acadêmica estava totalmente descompromissada com a possibilidade de um espírito científico propositivo e inovador.

O enfoque hermenêutico jurídico-constitucional de apreensão dos valores imanentes ao ensino nos Cursos de Direito serve de supedâneo à concatenação entre as características de sensibilidade e racionalidade exigidas do profissional jurídico (em especial o advogado) e a complexidade dos novos fenômenos sociais surgidos no contexto da pós-modernidade e carecedores de proteção à luz dos ditames emanados do pós-positivismo.

A mutação paradigmática do ensino jurídico revela o seu caráter dinâmico e transformador. A realidade jurídica no contexto do pós-positivismo e da pós-modernidade é bastante complexa, não podendo ser redutível apenas aos paradigmas outrora vigentes quando da formatação das atuais matrizes curriculares dos cursos jurídicos.

Neste jaez tem-se que os métodos de interpretação das normas jurídica estabelecidas pela Hermenêutica, vão admitir uma adaptação às situações impostas pelo caso concreto. A primazia exegético-dogmática da lei cede espaço ao sopesamento de princípios com a valorização da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais na abordagem do ensino jurídico em interface com a necessidade de manutenção do Exame da OAB.

A Portaria No.: 1886/94 trouxe diversos paradigmas representativos de avanços nas diretrizes curriculares dos Cursos Jurídicos que poderiam resultar  em uma melhora na qualidade do Ensino Jurídico, porém o processo de implantação da Portaria implica em uma mudança de práticas e ideologias que se perpetuam por diversas gerações de juristas. A Resolução CNE/CES No.: 09, de 29 de Setembro de 2004 corrobora, atualiza e aperfeiçoa os paradigmas ventilados pela Portaria No.: 1886/94 de forma a sedimentar efetivamente uma nova realidade  para os Cursos Jurídicos.

O ensino jurídico é dotado de um dinamismo que deve acompanhar a evolução dos fatos sociais, dotado de historicidade e, como tal necessita dos contributos extraídos a partir das inovações constantes em seu processo de formatação progressista e democrática para uma investigação transversal acerca de fatores extra-jurídicos, a partir dos quais se configurou um viés mutacional na problemática da metodologia do ensino jurídico. O ensino jurídico se democratizou, mas não tem sido capaz de manter uma qualidade esperada pela sociedade e pelos jurisdicionados. Não há que se negar o profundo impacto social da função social do Direito uma vez que o advogado será um profissional voltado à plena efetivação dos direitos humanos fundamentais e dos valores informativos da democracia brasileira. Eis que surge a necessidade de compulsoriedade do Exame da OAB e, ao mesmo tempo de sua permanente adequação aos reclamos sociais.

O profissional do Direito deve ter uma visão interdisciplinar, holística e sistemática, compromissada com a transformação social. Um dos mecanismos de aferição da capacidade do advogado é a aprovação no Exame da OAB de forma a não banalizar um ofício tão caro à implementação dos valores imanentes ao Estado Democrático de Direito consagrado na Constituição Federal de 1988.

6.  REFERÊNCIAS

 

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[1] Especialista em Direito Processual Penal pela ESMEC/UFC (2003). Mestre em Direito Constitucional pela UFC (2009). Doutorando em Direito Constitucional pela UFC. Professor Assistente do Departamento de Direito Privado da UFC, das disciplinas de Direito Civil II (Obrigações), Direito Empresarial e Estágio Supervisionado II. Foi Advogado Júnior da ECT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos) de 2008 a 2011.Bolsista CAPES. Vice-coordenador da Graduação da Faculdade de Direito da UFC. E-mail: williamarques.jr@gmail.com

[2] HOLANDA, Sérgio Buarque de, 1995, 157: “De qualquer modo, ainda no vício do bacharelismo ostenta-se nossa tendência para exaltar acima de tudo a personalidade individual como valor próprio, superior às contingências. A dignidade e importância que confere o título de doutor permitem ao indivíduo atravessar a existência com discreta compostura e, em alguns casos, podem libertá-lo da necessidade de uma caça incessante aos bens materiais, que subjuga e humilha a personalidade. Se nos dias atuais o nosso ambiente social já não permite que essa situação privilegiada se mantenha cabalmente e se o prestígio do bacharel é sobretudo uma reminiscência de condições de vida material que já não se reproduzem de modo pleno, o certo é que a maioria, entre nós, ainda parece pensar nesse particular pouco diversamente dos nossos avós. O que importa salientar aqui é que a origem da sedução exercida pelas carreiras liberais vincula-se estreitamente ao nosso apego quase exclusivo aos valores da personalidade. Daí, também, o fato de essa sedução sobreviver em um ambiente que já a comporta dificilmente. Não é outro, aliás, o motivo da ânsia pelos meios de vida definitivos, que dão segurança e estabilidade, exigindo, ao mesmo tempo, um mínimo de esforço pessoal, de aplicação e sujeição da personalidade, como sucede tão freqüentemente com  certos empregos públicos”.

[3] Em idêntico sentido, confira-se NASPOLINI SANCHES, Samyra. H. D. F.; BENTO, Flávio. On line: “Com a possibilidade de criação de novas faculdades, ao iniciar-se o século XX, o processo de descentralização fez surgir no ano mesmo de 1891 duas Faculdades no Rio de Janeiro e uma na Bahia; em 1892, em Minas Gerais; em 1900, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul; em 1902, no Pará; em 1903,  no Ceará; em 1908, no Amazonas; em 1912, no Paraná e em Niterói. Em 1915 surge uma Faculdade Estadual no Rio de Janeiro”.

[4] Tradução livre: “En su significación axiológica objetiva los derechos fundamentales representan el resultado del acuerdo básico de las diferentes fuerzas sociales, logrado a partir de relaciones de tensión y de los consiguientes esfuerzos de cooperación encaminados al logro de metas comunes. Por ello, corresponde a los derechos fundamentales un importante cometido legitimador de las formas constitucionales del Estado de Derecho, ya que constituyen los pressupostos del consenso sobre el que se debe edificar cualquier sociedad democrática; en otros términos, su función es la de sistematizar el contenido axiológico objetivo del ordenamiento democratico al que la mayoría de los ciudadanos prestan su consentimiento y condicionam su deber de obediencia al Derecho. Comportan también la garantia esencial de un proceso político libre y abierto, como elemento informador de cualquier sociedad pluralista”.

[5] Tradução livre: “De este modo, la función directiva de los derechos fundamentales, considerada en su origen como únicamente provisional, se convierte hoy en tarea permanente, puesto que los componentes de los derechos fundamentales que sobrepasan el status quo resultan aún más importantes que los que lo garantizan. Los derechos fundamentales actúan como señal de alarma, incorporada al orden jurídico, de los déficits de libertad del derecho válido y como princípio dinámico del reajuste del derecho.”.

[6] Tradução livre: “La ciencia del Derecho, jurisprudencia o dogmática jurídica, es la ciencia cuyo objeto es el Derecho (…) No incumbe a la ciencia del Derecho, por el contrario, indagar sus fundamentos  supuestos (la esencia general de lo jurídico, la índole del conocimimento y el estilo del pensamiento que ejercitan los juristas, el último sentido y la justificación metafisica de los datos del Derecho)”.

[7] Tradução livre: “La Declaración de los derechos del hombre, el Código de Napoleón y todos los códigos modernos que proceden más o menos de esos dos actos, descansan en una concepción puramente individualista del Derecho. Hoy día se elabora un sistema jurídico fundado sobre una concepción esencialmente socialista.”

[8] Observe-se: STF- RE 603583 / RS, Relator: Min. Marco Aurélio, julgamento: 26/10/2011. Fonte:  DJe-102 DIVULG 24-05-2012 PUBLIC 25-05-2012.

william paiva-h150Prof. William Paiva Marques Júnior

Docente do Curso de Direito – UFC
williamarques.jr@gmail.com