ENCONTROS UNIVERSITÁRIOS 2014 – MESA REDONDA 03: TECNOLOGIAS E MÍDIAS NOS PROCESSOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM

andrey chaves-h150Andrey Chaves

Diego Adaylano de Monteiro Rodrigues – Professor substituto do Departamento de Biologia e mestrando da Faculdade de Educação da UFC. O trabalho apresentado por ele visava à divulgação científica, especialmente para crianças. Para isso, ele e seus colaboradores produziram uma revista de divulgação científica bastante interessante e, de fato, bem chamativa para o público infantil. Este trabalho, que pode ser conferido com mais detalhes no site criado pelo grupo de pesquisa do qual o palestrante faz parte (LEBIO) http://ipecriancasrevista.wix.com/ipecriancas, deu tão certo que foi agraciado com o prêmio Prof. Rubens Murillo Marques 2014, da Fundação Carlos Chagas, o qual é dado a iniciativas inovadoras na área de educação e formação de professores do ensino básico.

Considero importantíssimo este trabalho junto às crianças, pois é notório que existe uma série de estereótipos e preconceitos que precisam ser desconstruídos com relação aos cientistas, talvez pelo fato desta ser uma profissão um tanto incomum e até mesmo pouco incentivada atualmente nas escolas (certamente menos incentivada que as engenharias, direito e medicina). Alguns veem cientistas como “loucos”, outros acham que são todos gênios, o que torna essa profissão aparentemente inatingível para pessoas “comuns” e restrita somente àqueles “escolhidos”, portadores de um dom. Isso precisa ser desmistificado: o pesquisador é sim uma pessoa comum, com a diferença apenas de ter sido treinado em uma disciplina que talvez não seja tão atrativa para o público em geral durante a escola. Claro que, assim como existem os grandes cirurgiões, grandes juristas, o melhor chef de cozinha, ou o melhor artista plástico, existem também os excelentes cientistas, aqueles que recebem os grandes prêmios. Isso, porém, não faz de todos os cientistas pessoas extraordinárias – qualquer um, se interessado, pode sim ser treinado para ser um bom cientista. Na verdade, essa é a regra – os gênios são a exceção.

É incrível como quando se vê filmes como Interstellar, que está em cartaz agora nos cinemas, muitos dos espectadores acham o tema do filme, que envolve física, interessantíssimo. Como físico, tenho ouvido bastantes perguntas sobre este filme. Isso, na verdade, acontece comigo sempre que algum aluno ou amigo assiste a algum documentário ou filme envolvendo astronomia, viagens no tempo, etc. Isso me leva a crer que física é sim um tema atrativo para o grande público. Porém, quando se vai à escola, todos parecem perder esse interesse inicial por este tipo de tema. Claro que parte da culpa por essa perda de interesse tem a ver com o currículo adotado nas escolas, mas acredito também que uma boa parte disso está ligada a esse preconceito de que este tipo de ciência é algo muito difícil, só para uma certa classe de pessoas, naturalmente capazes de entendê-la. Certamente, um link está faltando aí entre o que é interessante para o público geral na área de ciências e o que é efetivamente ensinado na escola, e os trabalhos de divulgação científica, especialmente os que desmistificam essa profissão, têm um papel importantíssimo em refazer essa ligação.

Ao meu ver, trabalhos como o do Diego, ao desmistificar o cientista e atrair a atenção das crianças para esta profissão, cumprem o papel que cumpriam aqueles antigos programas da TV Cultura: O Mundo de Beakman, O Professor, etc. Por sinal, que fim levaram essas produções?

Francisco Ronaldo Belém Fernandes – Mestrando em Engenharia Agrícola na UFC. O trabalho apresentado por ele consistia em levar alunos dos cursos de Agronomia para visitar um abrigo de máquinas, como parte da disciplina de Motores e Tratores. A ideia se baseia em alguns estudos anteriores de filósofos da educação, que sugerem que as aulas devem ser planejadas de forma a privilegiar o interesse do aluno e, assim, serem construídas através de uma maior parceria entre aluno e professor. De fato, tenho visto em Universidades bem sucedidas no exterior diversos exemplos de disciplinas onde os alunos são instigados a participar ativamente, muitas vezes com visitas a laboratórios, onde eles podem ver seu futuro ofício sendo executado na prática e, com isso, questionar imediatamente sobre qualquer dúvida que apareça.

O fato de que este tipo de aula instiga o aprendizado do aluno se confirmou ainda mais pelo questionário proposto no final do trabalho para os alunos participantes, onde a maioria demonstrou concordar com este formato de aula.

Na verdade, o curso de Agronomia, assim como qualquer curso superior, tem um viés acadêmico forte, enquanto este tipo de visita de campo parece ter um impacto maior sobre a parte técnica da profissão de agrônomo. Ainda assim, tal parte técnica tem papel fundamental na formação do aluno. Além disso, não é difícil ouvir alunos reclamando que viram pouca prática nos cursos superiores que frequentaram, ou até mesmo dizerem que aprenderam muito mais quando frequentaram os cursos técnicos ofertados frequentemente, por exemplo, pelo SENAI. Acontece que ambas, a teoria e a prática são importantes, mas certamente a prática empolga muito mais o aluno, e isso pode ser usado, como fez o Ronaldo em seu trabalho, para estimular o aluno durante todo seu curso superior na Universidade.

Samira Macêdo Pinheiro de Amorim – Mestranda da Faculdade de Direito da UFC. A discussão proposta pelo trabalho dela começava com a percepção da necessidade dos educadores de hoje se adaptarem a esta nossa nova realidade, onde temos novas tecnologias para obter e repassar informações, além de uma enorme quantidade de dados disponíveis na internet.

Na verdade, no meio jurídico, onde a Samira atua, novas tecnologias aplicadas à educação já são amplamente utilizadas: existem vários cursos on-line e de ensino à distância, que trazem a oportunidade dos alunos de Direito estudarem com os melhores juristas, palestrando de qualquer lugar do mundo. Porém, o grupo de estudos da Samira preferiu uma abordagem presencial, mas usando redes sociais, como o Facebook. Assim, foi criado um grupo no Facebook para uma disciplina de Direito Previdenciário, onde os alunos participaram ativamente.

Uma dificuldade nesta abordagem é o fato de que é necessário estimular os alunos a participarem do grupo. Apesar de quase todos passarem grande parte do tempo no Facebook, esta rede social, assim como praticamente todas as outras, não foi feita a priori para estudar, e sim, para entretenimento.

Por outro lado, algumas vantagens dessa abordagem são óbvias: o professor da disciplina pode postar imagens para ilustrar temas de discussão, marcar eventos, postar notícias e discutir imediatamente sobre elas com os alunos, etc. Mas as vantagens vão além disso: os alunos parecem se sentir mais confortáveis no Facebook que na sala de aula; alunos mais tímidos, que não costumam falar muito e expressar suas opiniões nas aulas acabam brilhando bem mais com seus comentários no ambiente virtual do Facebook, onde toda aquela timidez do ambiente real parece desaparecer. Mais ainda, temas polêmicos e atuais podem ser discutidos de forma bem mais dinâmica, tomando exemplos de um contexto real, com notícias de jornal on-line, por exemplo.

O Facebook já é naturalmente uma rede social onde as pessoas costumam postar suas opiniões sobre diversos temas. Algumas dessas opiniões, principalmente as mais polêmicas, surgem, muitas vezes, de interpretações erradas das nossas leis, dos princípios morais, ou da nossa constituição. Sendo assim, um grupo do Facebook criado para uma disciplina do curso de Direito pode ser usado até mesmo para buscar este tipo de comentário de leigos em Direito no Facebook e debater entre os alunos qual conceito do nosso sistema legal está sendo ferido com este tipo de comentário, ou que parte da lei foi mal interpretada. A conclusão deste exercício, com as explicações e conceitos corretos, ao ser postada no Facebook, poderia ficar disponível para todos os amigos na rede social, o que serviria até mesmo como um texto informativo para quem não estuda direito, cumprindo assim um papel de extensão do curso para a sociedade.

ENCONTROS UNIVERSITÁRIOS 2014 – MESA REDONDA 04: CASa DA AFROCULTURA – AFRICANIDADE E AFRODESCENDÊNCIA: A IMPORTÂNCIA DO TEMA NAS DIVERSAS ÁREAS DO CONHECIMENTO E OS DESDOBRAMENTOS DA LEI 10.639/2003

Prof. Henrique Antunes Cunha Junior – Professor Titular da UFC, trabalha na pós-graduação em Educação na FACED. Filho de estudiosos da cultura Africana, ele demonstrou ter um profundo conhecimento (e, mais que isso, orgulho) dessa cultura e de sua influência em diversas partes do mundo. Em sua palestra, foram sugeridos e debatidos diversos exemplos de elementos da cultura Africana que podem (e talvez devam) ser inseridos na educação básica no Brasil. De fato, durante toda nossa educação nos níveis fundamental e médio, somos levados a crer que todo esse conhecimento que adquirimos, todas essas tecnologias, tanto na área das ciências exatas como das humanas, são frutos do desenvolvimento somente de países europeus, desde a Grécia Antiga. Parecemos esquecer o quão importantes e sofisticadas foram as civilizações Africanas e Asiáticas.

Dos vários exemplos citados pelo Professor Henrique para o ensino de matemática e ciências a partir de fatos, lendas e crenças populares em países africanos, um me chamou bastante a atenção: ele contou a história de um pesquisador americano, Ron Eglash, que percebeu padrões fractais na organização de ruas e casas em algumas vilas visitadas por ele em todo o continente. Padrões fractais são aqueles que se repetem em diversas escalas. Um exemplo comum na natureza é a folha da samambaia: cada um de seus galhos se ramifica em pequenos galhinhos que lembram o galho maior; cada galhinho, por sua vez, é ramificado em outra série de galhinhos ainda menores, e assim por diante.

O fato de uma vila ter sido toda construída seguindo este tipo de padrão é fascinante e nos faz pensar: por que motivo isso aconteceu? É possível que haja um certo misticismo por trás disso, até mesmo porque este é um tipo de padrão, em princípio, similar ao encontrado em algumas folhas e galhos, e sabemos o quão importante as árvores são na religião e cultura africanas. Por outro lado, pode haver até uma explicação científica para isso. Na verdade, deveríamos primeiro nos perguntar: por que as folhas e galhos seguem padrões fractais? Aliás, por que até as ramificações do nosso pulmão seguem um padrão fractal? A resposta está no fato de que este tipo de padrão tende a maximizar a área exposta em uma dada região. Por exemplo, com galhos em forma fractal, maximiza-se a área de exposição das folhas ao sol, o que, consequentemente, ajuda na fotossíntese. O padrão fractal dos nossos pulmões faz com que tenhamos a maior área possível para absorção de oxigênio para nosso sangue. Portanto, uma consequência do padrão fractal dessas vilas pode ser o fato delas aproveitarem da forma mais otimizada a área coberta pelas ruas.

Por outro lado, não podemos afirmar com certeza que essa otimização da área das vilas foi intencional. Provavelmente, a explicação mística é a mais adequada nesse caso. Porém, vou usar aqui um exemplo usado pelo próprio Professor Henrique em outro contexto: você concorda com aquela crença popular que diz que um galho de arruda traz sorte? Se você não crê nisso, lembre-se ao menos que a arruda é um bom repelente natural de mosquitos, e doenças muito graves na África por muitos anos eram transmitidas por mosquitos. Aqueles que tinham arruda em casa tinham a “sorte” de nunca ficarem doentes. Na prática, então, arruda trazia “sorte”, mas hoje sabemos a explicação para isso baseado em ciência. Talvez, os fundadores dessas vilas, que num momento de iluminação decidiram fazê-las simplesmente imitando o que viam na natureza, acabaram, mesmo que não intencionalmente, otimizando a área das ruas na vila que construíam.

Nos próximos dias, postarei aqui relatos sobre todas as palestras que vi quando participei das mesas redondas nos Encontros Universitários 2014. As palestras, de tão interessantes, instigaram longas discussões e, como mediador, decidi não expressar meus comentários na hora, para dar voz a todos os ouvintes na sala. Sendo assim, postarei aqui também os comentários que gostaria de ter feito na ocasião.