O povoCom o combate ao crime organizado feito pelos Estados do Sudeste na última década, em especial São Paulo, as facções criminosas que lá tentavam imperar migraram para outros locais, em um verdadeiro êxodo em busca da terra prometida da impunidade, um lugar em que os crimes não são investigados, onde as cidades não possuem sequer Delegacias e em que o Governo insiste em esperar que as sete pragas da criminalidade – as facções do crime organizado – que assolam a todos que lá vivem sejam neutralizadas apenas por propagandas enganosas que pregam um controle que, na realidade, não existe. Essa Terra Prometida da impunidade, infelizmente, é o Ceará.

Essa migração das facções ocorreu com o Primeiro Comando da Capital – PCC e com o Comando Vermelho – CV, as quais, sem nenhuma cerimônia, dominaram não somente o comércio ilegal de drogas, mas também o próprio sistema carcerário Estadual, o qual conta atualmente com uma população de 34 mil presos, dos quais 5 mil são do PCC e  4 mil ligados ao Comando Vermelho. Até aqui, o argumento falho e a tentativa equivocada do Governo Estadual de culpar o Governo Federal por não combater eficazmente as facções do Sudeste e com isso apenas as fazer se mudar para o Nordeste, seria plausível, apesar de ainda inaceitável.

Entretanto, esse argumento de simplesmente jogar a culpa para o Governo Federal, além de não resolver o problema, ainda é comprovadamente errôneo, uma vez que existem outras duas facções regionais, sendo que uma delas surgiu aqui mesmo no Ceará após o claro vácuo de poder deixado pelo atual Governo ao recuar na instalação dos bloqueadores de celulares nos presídios estaduais. Tratam-se da denominada Filhos do Norte – FDN e da cearense Guardiões do Estado – GDE, a qual é a mais sanguinária de todas elas.

A GDE simplesmente não tem limites e está completamente fora do controle do Estado cearense, pois além de ser a atual “administradora” de considerável parte do sistema carcerário cearense, ainda proporciona chacinas quase toda semana; expulsa moradores de bairros que pretende controlar; invadiu e pichou salas de Juízes estaduais que determinaram transferências de cadeias para presídios de alguns de seus membros; executam seus rivais em plena luz do dia e ainda propagam a execução desses crimes com elevada ostentação e deboche pelo Estado nas redes sociais.

Diante de sombrio quadro, como o Governo ainda pode afirmar que está no controle da grave crise de Segurança Pública que atravessamos? Como culpar o Governo Federal pelo não bloqueio dos celulares nos presídios estaduais? Como culpar o Governo Federal pelo absoluto sucateamento da Polícia Civil cearense, a qual, heroicamente, sobrevive – a palavra é essa mesmo: sobrevive! – sem ter sequer papel em suas impressoras? Como culpar o Governo Federal pela política de Segurança Pública Estadual que tem combatido a criminalidade de maneira apenas pontual, com ações meramente midiáticas que só prestam para disfarçar a verdadeira guerra em que vivemos no Ceará?

O Governo Estadual tem que admitir que simplesmente negar um fato não o faz desaparecer. Negar que o Estado perdeu o controle dos presídios e que com isso a violência explodiu no Ceará, não fará com o que o Estado retome o controle da situação. Pelo contrário, é momento de admitir os equívocos no combate à violência e corrigir o rumo da política criminal estadual.  O compromisso do Estado não pode ser com os próprios erros.

O pior é que todo esse caos na Segurança Pública vem sendo anunciado e as suas causas e possíveis soluções apontadas por diversos especialistas e Professores da área, mas o Governo insiste em fazer ouvidos de mercador para as críticas, as quais, se fossem pelo menos discutidas, poderiam trazer um horizonte de paz e segurança para o verdadeiro titular do Poder Estatal, o povo.

 

Daniel Maia

Professor Doutor de Direito Penal da UFC